A política industrial brasileira será submetida a seu maior teste em 20 anos a partir de quinta-feira, 13. Em Genebra, a União Europeia vai acusar o Brasil na Organização Mundial do Comércio (OMC) por violar as regras internacionais ao dar incentivos fiscais a vários setores e vai pressionar por uma reforma profunda nas regras de zonas francas, como Manaus. Uma derrota do Brasil pode forçar o governo de Dilma Rousseff a rever toda sua estratégia comercial e, num ano de eleições, o impacto pode ser também político.
O Brasil terá de dar respostas a quatro ataques de Bruxelas: os incentivos fiscais do Inovar-Auto, entre eles a redução de IPI, incentivos ao setor eletrônico, a redução de impostos para vários outros segmentos da economia e as regras consideradas ilegais de benefícios a empresas que se instalam em Manaus. Na visão dos europeus, isso cria uma distorção da competitividade das exportações nacionais e dificuldades para produtos importados no País.
Ao jornal O Estado de S. Paulo, o comissário de Comércio da UE, Karel de Gucht, declarou que a disputa não tem relação com as negociações entre Mercosul e Europa e espera que o contencioso não contamine a relação bilateral. “Tratamos disso de forma bilateral e levamos ao conhecimento de todos. Como não houve reação do Brasil, decidimos levar o tema para a OMC. Mas não há relação com as negociações com o Mercosul.”
Brasília vê a situação de forma diferente e, nos bastidores, deixa claro que não há como evitar uma contaminação. A interpretação no governo era de que os europeus, sabendo que as negociações entrariam numa fase decisiva a partir do fim de fevereiro, passaram a usar os tribunais da OMC como forma de pressionar o Brasil. Um dos pontos da negociação entre Mercosul e UE é justamente o que fazer com Manaus, considerado em Bruxelas um “buraco negro” nas regras comerciais.
Para se defender, o Palácio do Planalto enviou a Genebra uma equipe de peso para defender a política industrial nacional, liderada pelo embaixador Paulo Mesquita. O argumento brasileiro é de que os programas estão dentro das regras internacionais e as importações não têm sido afetadas. Prova disso seria a balança comercial negativa e o fato de que as exportações europeias ao Brasil continuam em alta.
Impacto
Numa primeira fase, as consultas serão realizadas apenas entre Europa e Brasil. Mas, se a UE deixar Genebra na sexta-feira insatisfeita com as respostas, poderá pedir que os juízes da OMC avaliem o caso.
Um dos temores no governo é de que empresas que estejam pensando em investir no Brasil para se aproveitar dos incentivos fiscais revejam seus projetos diante da incerteza do julgamento na OMC. Outra preocupação é de que uma decisão poderia ser anunciada às vésperas das eleições, com potencial repercussão negativa para Dilma. O que ninguém esconde no Brasil é que a disputa promete ser a maior já envolvendo o País.
“As duas partes estão conversando e esperamos que cheguem a um entendimento”, disse Roberto Azevedo, diretor da OMC. No ano passado, ele ainda era o embaixador do Brasil em Genebra e, em diversas ocasiões, foi obrigado a defender a política industrial brasileira.
Agora, o governo também terá de dar uma resposta sobre um assunto que por anos deixou os europeus irritados: as zonas francas. Em 21 de dezembro, o Estado revelou com exclusividade que a Europa havia submetido documentos à OMC exigindo o fim dos benefícios do governo federal a zonas industriais especiais. Além de Manaus, as zonas francas questionadas são: Boa Vista e Bonfim (RR), Tabatinga (AM), Guajará-Mirim (RO), Macapá e Santana (AP), além de Brasileia e Cruzeiro do Sul, no Acre. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
Fonte: Estadão