Tombo de veículos derruba produção da indústria e afeta outros setores



Diante do efeito cada vez mais reduzido dos descontos do IPI, de estoques elevados, crédito escasso e recuo das importações, o setor de veículos puxa para baixo a indústria e leva consigo uma extensa cadeia de fornecedores –de borrachas para pneus, vidros, plástico, autopeças e aço, entre outros.

Em maio, a produção de veículos (inclui caminhões) caiu 20,1% frente ao mesmo mês de 2013. Foi a perda de maior impacto para a indústria no mês, que caiu 3,2% no período, segundodados do IBGE divulgados nesta quarta-feira (02).

Em abril, esse setor já havia recuado 21% na mesma base de comparação. De janeiro a maio, soma queda de 12,5%, também o ramo que mais contribuiu para o fraco desempenho do setor industrial no acumulado do ano (-1,6%).

Para André Macedo, gerente da pesquisa de indústria do IBGE, há um “esgotamento” da política de redução do IPI, aliado a menores exportações do setor sobretudo para a Argentina –que convive com uma crise de confiança com a possibilidade de um novo calote e retração de seu PIB.

“Depois de muitos anos, o impacto do IPI pode já não ser o mesmo, já que as pessoas não compram um bem de alto valor sempre –ainda mais num cenário de confiança reduzida de consumidores”, afirmou.

O governo deixará de arrecadar R$ 962 milhões no segundo semestre com a decisão de prorrogar até o fim deste ano descontos de imposto ao setor industrial. O IPI para veículos, que deveria voltar nesta terça-feira (1º) para sua alíquota cheia (entre 4% e 13%, dependo do modelo), continuará entre 3% e 10%.

Economistas questionam a eficácia da medida, já que não tem resultado em impactos importantes na produção.

ESTOQUES

Outros fatores que prejudicam o setor, diz Macedo, são os estoques acumulados –e a redução da produção vai na direção de diminuir o acúmulo de veículos nos pátios das montadoras- e o crédito reduzido, especialmente para veículos.

Segundo dados do Banco Central, o crédito para compra de carros concedido a pessoas físicas caiu 12,6% no período de março a maio, quando a produção do setor afundou de modo mais intenso e coincidiu com a terceira queda seguida da produção de bens duráveis (inclui ainda móveis e eletrodomésticos), com perdas de 5% em março, 12,5% em abril e 11,2% em maio.

A categoria foi puxada para baixo por veículos, segundo o IBGE.

As concessões de crédito para pessoas físicas, que irrigam a economia e fazem girar principalmente produtos de valor mais alto como os veículos, caiu 1,7% nesses três meses de declínio consecutivo da produção da indústria e da fabricação de veículos.

ENCADEAMENTO

Com peso direto de 10% na produção industrial, o setor de veículos espalha seu fracos resultados para demais ramos.

No acumulado deste ano, o tombo das montadores carreou as perdas de segmentos como metalurgia (aço), com retração de 3,4%. O ramo, também com peso relevante na estrutura industrial do país, sofre com maiores importações e dificuldades de acessar o mercado externo.

Também afetou produtos químicos (tintas, no caso), com retração de 3,7%.

Segundo dados da EPE (Empresa de Pesquisa Energética), o consumo industrial de energia, em maio, caiu 4,3%, um indicativo do menor ritmo de atividade do setor. O resultado puxou o desempenho global da demanda por energia para o menor crescimento neste ano –1,5%.

DESEMPENHO EM MAIO/2014 CONTRA MAIO/2013

SETOR

DESEMPENHO (em %)

Veículos automotores, reboques e carrocerias

-20,1

Impressão e reprodução de gravações

-13,4

Metalurgia

-10,5

Produtos diversos

-10,5

Móveis

-10,3

Produtos de metal

-9,5

Outros produtos químicos

-5,7

Produtos de madeira

-4,2

Produtos têxteis

-4,2

Produtos de borracha e de material plástico

-3,6

Confecção de artigos do vestuário e acessórios

-3,4

Couro, artigos de viagem e calçados

-3,1

Máquinas e equipamentos

-3,1

Produtos de minerais não-metálicos

-2,9

Coque, prods. deriv. do petróleo e biocombustível

-2,4

Máquinas, aparelhos e materiais elétricos

-1,8

Celulos, papel e produtos de papel

-1,5

Outros equipamentos de transporte

-1,2

Produtos do fumo

0,1

Produtos alimentícios

2,1

Bebidas

2,9

Perfumaria, sabões e produtos de limpeza

5,7

Indústrias extrativas

7,6

Equips. de informática, prods. eletrônicos e ópticos

7,8

Produtos farmoquímicos e farmacêuticos

8,1

Manut., reparação e instalação de máqs. e equips

9,6

INDÚSTRIA GERAL

-3,2

Fonte: IBGE

IMPACTO NO INVESTIMENTO

A derrocada do segmento de veículos também derruba os investimentos. Um sinal é a queda de 9,7% da produção de bens de capital (máquinas e equipamentos para a indústria, agropecuária, construção e transporte) frente a maio de 2013 e de 2,6% ante abril –assim como a indústria geral, na terceira retração seguida.

A categoria é um termômetro de desempenho dos investimentos na economia e teve seu pior desempenho ficou com o segmento de transporte (caminhões), com perda de 18,1% contra maio de 2013.

O investimento é dos componentes do PIB com pior desempenho neste ano.

O Bradesco aponta em relatório que, além do fraco desempenho da produção de bens de capital, os chamados insumos típicos da construção civil (areia, cimentos, vidros e outros) também apontam para nova queda do investimento no PIB do segundo trimestre, estimada pelo banco entre 3% e 5%.

No investimento, máquinas e equipamentos e a construção são os ramos de maior peso, com mais de 90%.

EFEITO DA COPA

Para Thaís Marzola Zara, da Rosenberg & Associados, o fato de a categoria bens de consumo semi e não-duráveis (bebidas, alimentos, remédios e combustíveis) ser a única que registrou avanço em maio (0,8% ante abril e 1% frente a maio de 2013) está ligado ao “efeito Copa”, com a maior produção de produtos alimentícios e bebidas.

Já Macedo, do IBGE, diz que no caso dos eletrodomésticos da linha marrom (TVs) a fabricação ainda cresce, mas o impacto do Mundial ficou concentrado no primeiro trimestre, quando o segmento cresceu 51,2%.

Em maio, a alta foi de 9,8%.

Para Zara, “sob este pano de fundo pouco animador” a expectativa de retração de 0,5% da indústria em 2014 está mantida, mas há possibilidade revisar o dado para baixo.

Fonte: Folha

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