A queda nos preços das commodities, o aumento nas importações de petróleo e a crise na Argentina levaram a balança comercial ao maior déficit para setembro desde 1998, o que colocou dúvidas sobre a possibilidade de o Brasil obter superávit no comércio exterior neste ano na avaliação de especialistas do setor.
Segundo o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (Mdic), no mês passado, o resultado da balança foi negativo em US$ 939 milhões e deixou o saldo no acumulado do ano novamente deficitário, desta vez em US$ 690 milhões. Em agosto, o resultado acumulado no ano era positivo em US$ 251,5 milhões.
Em setembro, as exportações caíram 10,2% ante o mesmo mês de 2013 no critério da média diária, enquanto as importações cresceram 4%. Grande parte dessa alta ocorreu em função do aumento de 46,4% nos desembarques de petróleo e derivados. De acordo com o diretor do Departamento de Estatística e Apoio à Exportação do Mdic, Roberto Dantas, a importação de petróleo varia de um mês para o outro e o incremento pode ser explicado por questões como programação de embarque.
No lado das exportações, os principais impactos negativos vieram do aprofundamento da tendência de queda nos preços de commodities e dos problemas enfrentados pela Argentina. Das 23 commodities mais vendidas mapeadas pelo ministério, 13 apresentaram recuo nos preços em setembro ante mesmo mês de 2013: minério de ferro (30%), soja (5,6%), algodão (6,2%), milho (17,7%), açúcar refinado (8,2%), celulose (9,7%), óleos combustíveis (12,3%) e petróleo (8,5%). Como resultado, as exportações de produtos básicos recuaram 15,1%.
Apenas em relação à Argentina, a queda nas exportações chegou a 39,7% por causa da retração na venda de automóveis e suas peças. O técnico do Mdic avaliou que os problemas no país vizinho responderam por 77% da redução nas vendas de produtos manufaturados em 2014, que é de 7,1% no acumulado do ano no critério da média por dia útil. Por outro lado, os embargos russos para carnes europeias levaram a aumento de 70% das exportações de proteína animal brasileira para o país em setembro ante mesmo mês de 2013.
Nenhum desses fatores, no entanto, fez o governo mudar sua previsão, de saldo “pequeno, mas positivo” no ano. “Acredito que nos próximos meses vai ter um certo arrefecimento de importação, não tem uma demanda forte neste momento”, disse Dantas.
Analistas, no entanto, observam nos fatores que jogaram para baixo o resultado de setembro um sinal de aumento da possibilidade de a balança registrar déficit.
José Augusto de Castro, presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), chama atenção para o fato de o país ter exportado neste ano 44,6 milhões de toneladas de soja, recorde histórico. “Mas isso mostra que não deve vir mais soja neste ano, enquanto existem mais US$ 2,3 bilhões obtidos com o grão no fim do ano passado. Isso e a queda do preço do minério preocupam. As exportações totais podem fechar o ano com recuo de 6%”, afirmou.
A venda de commodities por um preço menor, ainda segundo ele, é fruto de um excesso de oferta no mercado internacional. “Houve supersafra de milho e soja no Brasil, Argentina e Estados Unidos, que também tiveram recorde de exportação de petróleo. O problema não é de demanda”, disse.
A causa secundária do desempenho negativo do comércio exterior neste ano, na visão de Rodrigo Branco, economista e pesquisador da Uerj, é a desaceleração da economia brasileira, que está promovendo uma ajuste nas contas externas, inclusive a comercial.
“Sem dúvida nenhuma é uma resposta ao ajuste interno. Na redução das exportações há o efeito de uma indústria mais fragilizada e que vende menos manufatura. O recuo da importação responde a produção mais fraca e desaceleração do consumo”, afirmou Branco.
Mesmo com déficit de US$ 2,2 bilhões em setembro, a conta petróleo pode causar uma reversão do saldo negativo da balança até o fim do ano. De janeiro a setembro de 2013, a conta ficou deficitária em US$ 19, bilhões. Agora, o rombo caiu para US$ 15,2 bilhões. “Isso se deve ao aumento das exportações de petróleo. Se houver alguma ajuda, será via petróleo”, disse Castro.
Fonte: Valor Econômico