Por Ivo Ribeiro e Olivia Alonso
Carlos Pastoriza, da Abimaq: “O país vive um processo de desindustrialização cavalar, o qual passa despercebido”
Representantes de entidades de 21 setores da indústria de transformação já preparam as bases para recriar e reorganizar o que chamam de Coalizão Pro-Competitividade, lançada em meados do primeiro semestre para estabelecer um canal de diálogo com o governo federal, em uma busca de uma política mais efetiva para esse setor.
O principal objetivo desse grupo era mostrar, em um encontro com a presidente Dilma Rousseff, o nível crítico de dificuldades desse segmento, que tem um peso expressivo na economia do país. Não obteve sucesso, pois não conseguiu ser recebido pela presidentes. Teve apenas uma agenda com o ministro da Fazenda, Guido Mantega, um “pit stop” para tentar chegar ao Planalto. O ministro foi afável e ouviu as reivindicações, mas dali nada avançou.
À frente dessa coalizão, encabeçada pela Abimaq, da indústria nacional de máquinas e equipamentos, estão entidades de peso. A siderurgia (Instituto Aço Brasil), química e petroquímica (Abiquim), alimentos (Abia), produtos eletroeletrônicos (Abinee), calçados (Abicalçados), bens de capital (Abdib), autopeças (Abipeças) e petróleo (Onip), entre outros. A Anfavea, das montadoras, evitou compor o bloco, pois tem negociado diretamente com o governo.
Em conjunto, o grupo representa 51% da receita líquida de toda a indústria da transformação brasileira, 57% do pessoal empregado e tem faturamento de cerca de R$ 700 bilhões, informa o presidente da Abimaq, Carlos Pastoriza. Para ele, “o país vive um processo de desindustrialização cavalar, o qual passa despercebido, pois as empresas não estão fechando as portas, mas, sim, transformando-se em importadoras”.
Marco Polo de Melo Lopes, presidente-executivo do Instituto Aço Brasil, que trabalha em conjunto com Pastoriza nesse movimento, enfatiza que são necessárias medidas emergenciais. “Que pelo menos nos permita reverter a balança negativa desse segmento industrial.”
O grupo vai aguardar passar o calor da campanha política, que acaba dia 26, para se reunir e sistematizar um documento com todos os pontos indicados pelas lideranças. Esse documento será levado ao candidato reeleito como um programa que considera primordial para assegurar competitividade à indústria no curto prazo. Passada a eleição, acredita-se que o grupo terá chance de obter um diálogo, o que não teve até agora.
Para o executivo da siderurgia, independentemente de qual seja o nome vencedor na eleição, existe uma prioridade absoluta, que é reconhecer o problema crítico da indústria de transformação no Brasil. O objetivo da coalizão, acrescenta Pastoriza, é alertar as autoridades sobre medidas que defendam a toda a indústria, de forma horizontal. “Seremos um movimento apolítico e pragmático”, diz.
Segundo eles, a indústria saiu de um superávit de US$ 120 bilhões, acumulado de 2002 a 2007, para um déficit na balança comercial de US$ 130 bilhões, de 2008 a 2013. “É uma inversão brutal, que queríamos apresentar ao governo. Mas o que se verifica é que há uma negação em reconhecer tal situação”, afirmou Lopes.
O problema tende a se tornar mais crítico, aponta Pastoriza. “Há dez anos, tínhamos um superávit anual de US$ 40 bilhões. Estamos caminhando para um déficit de US$ 110 bilhões. É uma variação de US$ 150 bilhões que o país importa e deixa de exportar”.
Dentre uma longa lista de prioridades, o executivo do Aço Brasil disse ao Valor que cinco pontos são cruciais, e requerem medidas emergenciais, para estancar a perda de competitividade sistêmica da indústria de transformação no curto prazo.
Primeiro, ajustar o câmbio a um patamar real. Aos níveis de R$ 2,30 a R$ 2,40, considera-se que há uma desvantagem ainda alta, pois a desvalorização chega a 22% frente ao dólar. “Os países com quem competimos desvalorizam suas moedas artificialmente”, afirma Lopes. Rússia e China, por exemplo, têm uma desvalorização de 47% e 43% ante a moeda americana, diz. “Assim, fica difícil competir.”
A consequência é que isso levou a uma perda de capacidade tanto para competir com bens importados quanto na exportação de produtos fabricados aqui. “O governo tem de deixar claro se quer ou não ter uma base industrial forte no país”, afirma.
A cumulatividade dos impostos é outro ponto crítico, apontado pela coalizão, que indica a cobrança de impostos sobre os investimentos como mais um fator de perda de competitividade. “O Brasil é um dos poucos países no mundo onde ainda se tributa investimentos”, diz o dirigente do Aço Brasil.
Colocar os juros em padrões internacionais é outro pleito. A avaliação é que o sistema brasileiro é perverso e prejudica as indústrias. No Brasil, afirma, o juro real vai de 12%, 14% a 15% ou mais, enquanto lá fora chega até a ser negativo.
Por fim, entre as medidas emergenciais, um tema é considerado de vital importância, não só pela indústria, mas por toda a atividade econômica: a modernização e ampliação da infraestrutura logística. Expressivos ganhos de competitividade são esperados de ações e investimentos para rodovias, ferrovias, portos e outros serviços ligados a esse setor.
Lopes observa que a indústria de transformação no país, em razão da perda de competitividade, viu emagrecer sua participação no PIB, ano a ano, em pouco mais de duas décadas. Caiu de 25% para 13% ou menos que isso e que esse processo se acelerou de alguns anos para cá de forma abrupta.
O resultado, observa Lopes, é o aumento da primarização da pauta de exportação do país. “Há uma perda evidente na exportação de produtos com maior valor agregado, os manufaturados, e o aumento da fatia de grãos, minérios e outros bens sem ou de baixa agregação de valor.”
Pastoriza, da Abimaq, afirma que a indústria da transformação tem uma situação pior do que a de outros setores da economia, principalmente por ter impostos em cascata e grande concorrência dos importados. “Os setores extrativo e de construção civil, por exemplo, têm defesas naturais. Trabalham com produtos não importáveis, ou não têm incidência de impostos em cascata como temos. “
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Fonte: Patri Políticas Públicas