O pescoção do PIS/Cofins

 

EDITORIAL

Há quem endeuse a natureza como criadora de seres perfeitos, organismos tão bem-acabados quanto máquinas de alta tecnologia. Quem já viu uma girafa abaixar-se, porém, testemunhou como o produto da evolução gradual pode se tornar tão canhestro quanto o sistema tributário brasileiro.

Ao longo da evolução, espécimes desse ruminante africano que nasciam com pescoços mais longos alcançavam folhas de galhos mais altos nas árvores e conseguiam se alimentar melhor. Tal vantagem competitiva, porém, resultou em prejuízo para outras funções no corpo.

Algo semelhante se deu com nossos impostos, cujas alíquotas se esticaram com o propósito de alcançar melhor o bolso do contribuinte. Destaca-se, nesse monstrengo, o pescoção do PIS/Cofins.

O primeiro desses impostos disfarçados de contribuição pagaria um Programa de Integração Social; o segundo, o Financiamento da Seguridade Social. Ou seja, ambos servem para sustentar a despesa crescente com benefícios consagrados na Constituição de 1988.

Não há proposta de racionalização tributária que não preveja eliminação, simplificação ou encurtamento gradual de suas alíquotas. Somadas, elas chegam a 9,25% e garantem um quinto da arrecadação da União. A própria Receita cogita unificar as contribuições e facilitar o cálculo de sua cobrança.

Trata-se de tributo punitivo para a produção de bens, pois incide sobre o faturamento das empresas, e não sobre o lucro. Além disso, um emaranhado de regras permite compensar determinados créditos relativos a custos acumulados pelas firmas ao longo da cadeia produtiva; muitas terminam por não reclamá-los como poderiam.

Talvez a única deformação razoável a respeito do PIS/Cofins, uma vez que o mal parecia inamovível, tenha sido sua extensão para abranger bens importados. A providência veio em 2004, de modo a compensar a desvantagem competitiva dos produtos brasileiros.

Nem as girafas escapam do gravame perverso. Foi notícia no jornal “Valor Econômico”: um zoológico de Santa Catarina, após receber dos EUA três espécimes em troca de 32 aves, foi taxado em R$ 28 mil de PIS/Cofins-Importação.

A Fundação Hermann Weege, que mantém o zoo, questionou a cobrança na Justiça. Argumenta que animais não são produtos e que a transação não envolveu pagamento. O bizantinismo tributário no Brasil parece não ter fim: o Superior Tribunal de Justiça deu ganho de causa à Receita, e as girafas devem agora esticar o pescoço até o Supremo Tribunal Federal.

Fonte: Folha

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