Por Claudia Safatle
Para o ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, a fase “mais crítica” da crise econômica já está passando e “temos que ter as bases para um novo ciclo de crescimento”, liderado por ganhos de produtividade e expansão de investimentos. Ele acredita que depois da queda de 1,9% da atividade econômica, no segundo trimestre sobre o primeiro, a retração no terceiro trimestre será mais moderada e a economia se estabiliza nos três últimos meses do ano, encerrando o exercício com contração de 1,8%.
Em entrevista ao Valor, o ministro disse que é preciso uma proposta “clara e objetiva de recuperação da economia, uma política fiscal de longo prazo e muito diálogo”. A contenda fiscal que envolveu os ministros do Planejamento e da Fazenda, Joaquim Levy, ainda não acabou. Barbosa informou que o resultado consolidado fiscal para 2016 é um déficit de 0,34% do PIB, sendo que o governo central terá déficit de 0,5% do PIB. Levy, ontem, disse que “temos que trabalhar para alcançar a meta de superávit primário de 0,7% do PIB, que já é reduzida”, em audiência pública na Câmara dos Deputados.
Levy está preocupado com a trajetória da dívida pública. O ministro do Planejamento considera que o mundo não vai acabar se a dívida crescer temporariamente, desde que o governo tenha um plano de ajuste fiscal de longo prazo. O clima entre os dois não é bom. Ontem, Barbosa passou parte do dia em conversas com parlamentares da base aliada para convencê-los de que serão necessárias reformas estruturais para sanear o “rombo” nas contas públicas. O projeto de lei do Orçamento para 2016 foi para o Congresso com um déficit de 0,5% do PIB mas ele confia que o Estado “tem plenas condições de resolver seus problemas” e avisou que o governo tem propostas para enfrentar o desequilíbrio fiscal, mas elas dependem do Congresso.
Ele não subestimou o esforço do governo este ano para colocar a casa em ordem. “A presidente se convenceu da necessidade de uma reforma da previdência, da reforma administrativa que vai reduzir de 39 para 29 o número de ministérios, concordou com os reajustes dos preços da energia e ainda abraçou as concessões”. Admitiu rever as metas do Fies e do Pronatec, “programas que lhe são muito caros”, além das medidas aprovadas no primeiro semestre que restringiram acesso a benefícios trabalhistas e previdenciários e corte dos subsídios no crédito do BNDES.
Esse conjunto de iniciativas talvez não seja suficiente para enfrentar o tamanho da crise que o país vive, herdada do primeiro mandato de Dilma. O ministro alega, porém, que “é preciso ter calma”. Ele está convencido de que “o paciente vai se recuperar e a arrecadação do governo federal vai crescer. Não se resolve problemas estruturais simplesmente virando a chave”. O governo vai apresentar propostas para conter o crescimento dos gastos obrigatórios em três das maiores despesas públicas: previdência social, folha de salários e saúde. “Na saúde não basta botar mais recursos.
É preciso discutir fontes e usos, qualidade do gasto”, disse. A rigidez orçamentária deve ser enfrentada. Apenas 9,5% de um orçamento de R$ 1,210 trilhão, ou seja, R$ 115 bilhões, são gastos discricionários passíveis de contingenciamento. O resto são gastos obrigatórios por lei e despesas indexadas seja à variação do PIB seja às receitas. “Temos que ter essa discussão”, disse. Os gastos discricionários, que em 2014 consumiram 4,7% do PIB, para 2016 devem ficar em 4% do PIB, nível igual ao deste ano.
Houve, assim, uma redução de cerca de R$ 40 bilhões em relação ao ano das eleições presidenciais. As despesas obrigatórias crescem de 15% do PIB para 15,4% do PIB entre 2015 e 2016. O ministro, encarregado da elaboração da proposta orçamentária, disse que o governo não se eximiu da responsabilidade de apresentar o projeto de lei ao Parlamento. “Apresentamos a proposta do Orçamento com base nas regras. Ele é deficitário e não estamos confortáveis com isso. Queremos fazer superávit”.
Às críticas de que o Orçamento traz aumento do gasto, ele informou que o ministério fez uma análise criteriosa dos gastos, reviu metas, alongou prazos. Ciência sem Fronteiras, por exemplo, em 2016 apenas manterá os alunos que já estão no exterior. O orçamento do Minha Casa, Minha Vida é praticamente suficiente para concluir as obras já iniciadas. Do lado das receitas “o esforço é reduzir a complexidade e manter a arrecadação como proporção do PIB”.
Sobre ideias de elevação substancial do imposto sobre herança e criação do imposto sobre grandes fortunas, Barbosa as considera corretas do ponto de vista social, mas de baixo poder arrecadatório. Para superar os efeitos da recessão sobre as receitas da União, é preciso retomar o crescimento econômico. Barbosa avalia que os primeiros sinais de vida foram dados pela recuperação do saldo comercial. A desvalorização da taxa de câmbio incentivou a substituição das importações. Confia que a segunda etapa será a expansão dos investimentos, que ocorrerá ainda no primeiro semestre de 2016.
Até lá a estabilidade econômica estará consolidada com inflação baixa, melhora da regulação dos mercados, taxa de câmbio desvalorizada, concessões de obras de infraestrutura e a questão fiscal bem encaminhada. Nesse ambiente de inflação baixa, os juros estarão em queda e, no segundo semestre do próximo ano, o ministro conta com a recuperação do consumo das famílias. “Estaremos criando um novo ciclo de recuperação do consumo e do crédito em bases sustentáveis”, avalia.
Se esse é o quadro esperado para a demanda, do lado da oferta o foco será a produtividade que será alcançada com base em quatro eixos: aumento dos investimentos em máquinas e equipamentos e em infraestrutura; aumento dos investimentos em educação; estímulo à inovação “incremental” (adotando tecnologias de informação já disponíveis no exterior); e as reformas institucionais. Para Barbosa, o país está “atravessando uma fase difícil, mas o período mais crítico está passando”. Hoje a maior dificuldade é, para ele, “estabelecer consenso político”.
Fonte: Valor