Indústria surpreende e indica 3º tri ainda pior

 

Por Arícia Martins e Robson Sales

Afetada pelo enfraquecimento do consumo das famílias, a indústria surpreendeu economistas ao começar o terceiro trimestre em forte queda e piorou perspectivas já ruins para o desempenho do Produto Interno Bruto (PIB) no período. Para analistas, a retração de 1,5% da produção industrial entre junho e julho, descontadas as influências sazonais, indica que o setor ainda não conseguiu ajustar seu ritmo de atividade ao novo patamar da demanda doméstica. O desempenho surpreendeu os analistas ao ficar muito abaixo da expectativa de estabilidade.

A estimativa média de 20 instituições ouvidas pelo Valor Data indicava redução bem mais branda na passagem mensal, de 0,2%. As piores projeções apontavam recuo de 0,6%.

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A queda da produção em julho foi espalhada por 14 dos 24 ramos de atividade analisados na Pesquisa Industrial Mensal ­ Produção Física (PIM­PF), divulgada ontem pelo IBGE. Na medição por grandes categorias econômicas, três das quatro pesquisadas diminuíram sua produção em relação a junho. Mesmo a alta de 9,6% no segmento de bens de consumo duráveis não foi considerada uma boa notícia, uma vez que não reverteu o tombo de 13,7% do mês anterior. O confronto com o mesmo mês do ano passado também mostra um quadro preocupante.

Ante julho de 2014, a produção encolheu 8,9%, pior resultado para o mês desde 2009 (­10%). A redução no período chegou a 27,8% na fabricação de bens de capital, setor que reflete a dinâmica fraca dos investimentos. Para André Luiz Macedo, gerente da coordenação da indústria do IBGE, os dados de julho mostraram que o setor manufatureiro aprofundou sua tendência de queda. Segundo Macedo, a produção voltou ao mesmo nível de seis anos atrás, ao ficar 14,1% abaixo do patamar recorde da série histórica da PIM­PF, alcançado em junho de 2013. “Cada vez mais nos distanciamos do ponto histórico mais elevado”, disse. Rodolfo Morgato, do Santander, destaca o perfil disseminado da retração industrial.

Em seus cálculos, o índice de difusão ­ que mede a proporção de setores com crescimento na passagem mensal ­ caiu de 27,3% para 26,5% entre junho e julho. A média histórica do indicador é de 53,4%. “Os estoques continuam pesando sobre a produção, refletindo a piora contínua da demanda doméstica”, afirmou Morgato, para quem a produção vai encolher 6,5% em 2015, na comparação com o ano anterior. Em sua avaliação, a perda do poder de compra das famílias afetou a produção de bens de consumo em geral, mesmo em fabricantes de itens de primeira necessidade.

De junho para julho, os segmentos de produtos alimentícios e de bebidas recuaram ambos 6,2%. Sem expectativas de reversão na trajetória de deterioração do mercado de trabalho, diz o economista, uma recuperação consistente da indústria só é contemplada a partir de meados de 2016. O presidente da Lecca Financeira, Luís Eduardo Carvalho, acrescenta que a crise política também prejudica o cenário para a indústria, ao provocar mais desconfiança entre empresários e investidores. “Falta coordenação na área política, claramente há perda de espaço do [ministro da Fazenda, Joaquim] Levy no governo.

Isso tudo traz mais insegurança e menos confiança.” Uma dúvida sobre o segundo semestre é a velocidade estimada para a queda da produção, mas não há possibilidade de melhora, diz André Muller, da AZ Quest, dado que o consumo das famílias parece ainda não ter atingido seu piso. Como as fábricas terão que continuar ajustando sua produção a um nível de demanda mais baixo, a atividade industrial deve ter seguido no campo negativo em agosto, avalia ele.

Se a produção ficar estável nos próximos dois meses, Muller calcula que o indicador terá encerrado o terceiro trimestre com recuo de 1,9% em relação aos três meses anteriores, devido à herança estatística negativa deixada pelo dado de julho. Entre abril e junho, a produção da indústria diminuiu 2,4% sobre o primeiro trimestre do ano. “Por enquanto, espero uma queda menor no terceiro trimestre, mas o número de julho indica que um dado tão ruim quanto o do segundo trimestre pode ocorrer.”

A surpresa negativa com a última leitura da PIM­PF levou o Bradesco a rever suas estimativas para a variação do PIB no terceiro trimestre. Em relatório, o departamento econômico chefiado por Octavio de Barros informa que prevê retração de 0,8% para a economia de julho a setembro, mais forte que a queda de 0,4% esperada anteriormente. As projeções da AZ Quest e do Santander também podem ser cortadas em função da trajetória de fraqueza da produção industrial. Por ora, Muller estima que o PIB vai encolher 0,6% entre o segundo e o terceiro trimestres, e recuar 2,7% na média de 2015. Já Morgato trabalha com retração de 0,4% de julho a setembro e de 2,3% no ano.

Fonte: Valor

 

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