A capacidade de improvisar é uma qualidade. Basta conferir isso no futebol, principalmente no drible; Mas no governo é, por si só, um desastre
Celso Ming
A capacidade de improvisar é uma qualidade. Basta conferir isso no futebol, principalmente no drible. Mas no governo é, por si só, um desastre.
A condução do processo de elaboração do Orçamento da União de 2016 foi até agora um show de amadorismo e de irresponsabilidade. Precisou o Brasil ter sido rebaixado na classificação de risco para o grau de especulação para que o governo Dilma afinal acordasse e se propusesse a reverter o déficit de R$ 30,5 bilhões no orçamento, ou 0,5% do PIB, para o superávit de R$ 43,8 bilhões, ou de 0,7% do PIB, proposto anteriormente. É como destruir a rede de esgotos e, depois de emporcalhada a casa, tratar de improvisar um escoamento.
Um dos sinais de improvisação foi fornecido pelo ministro da Fazenda, Joaquim Levy, que tentou justificar a volta da CPMF com o argumento de que custaria uma merreca, apenas “2 milésimos, numa entrada de cinema”. Agora, os políticos querem aumentar a merreca em mais 1,8 milésimos para oferecer aos Estados e municípios e favorecer sua aprovação no Congresso.
A justificativa para a recriação da CPMF é o rombo brutal da Previdência. O ministro Levy citou seus números. Esse déficit foi de R$ 57 bilhões em 2014, passará a R$ 88 bilhões em 2015 e saltará para R$ 117 bilhões em 2016. Mais que dobrará em dois anos. (Veja o gráfico).
Essas estatísticas, por si sós, já dão o que falar. Até agora, o governo Dilma não admitia a existência de um problema grave no sistema previdenciário. Há um ano e meio mandou demitir o funcionário Leonardo Rolim do Ministério da Previdência porque avisara que o déficit não seria de apenas R$ 40 bilhões, como sustentava o governo, mas de R$ 50 bilhões. Na verdade, o déficit ficou ainda maior, ficou nos R$ 57 bilhões, como apontado por Levy. Se os critérios que prevaleceram em 2014 continuassem valendo, o ministro Levy teria de ser demitido por apontar estatísticas que em 2014 eram consideradas alarmistas. Mas agora, esse alarmismo serve ao objetivo de trazer de volta a CPMF: ora, se há uma situação de emergência, é preciso uma resposta de emergência.
No entanto, para o equacionamento desse problemão na Previdência, não basta a gambiarra da CPMF. Para problemas estruturais são necessárias reformas estruturais, entre as quais a que defina a idade mínima para a aposentadoria. Mas essas reformas só produzirão algum efeito a longo prazo. Enquanto esse longo prazo não chegar, os déficits continuarão comparecendo à planilha de despesas do governo federal. Agora, a pergunta: nesse caso, seria necessário criar uma nova CPMF a cada ano para tapar cada rombo?
De todo modo, o principal obstáculo desse pacote não é técnico; é político. O governo Dilma enfrenta problemas de legitimidade. Numa emergência, mesmo um programa cheio de defeitos, como este, poderia passar pelo Congresso se a presidente Dilma contasse com sustentação política. E é isso que mais lhe falta neste momento.
Ela perdeu apoio porque deixou a economia e as contas públicas se deteriorarem. Agora que se propõe a consertar os estragos, não tem base política para isso.
Os preços do minério de ferro continuam prostrados. Aí está a evolução dos últimos 12 meses.
Caçapa cantada
Mais que uma questão política, o pedido de demissão do ministro Mangabeira Unger, da Secretaria de Assuntos Estratégicos, é questão de lógica. O governo Dilma não consegue ser coerente. Não tem como aceitar estratégia. Embora tivesse o que dizer, Mangabeira não conseguia ser ouvido. Seu cargo foi dos primeiros a circular como parte do enxugamento dos ministérios, sem que tivesse sido previamente informado.
Fonte: Estadão