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Por Roberto Rockmann
Grandes empresas brasileiras estão criando aceleradoras de negócios para ter contato com novas soluções de serviços e produtos e oxigenar a estrutura interna. Em setembro, a seguradora Porto Seguro, que tem mais de 5 milhões de apólices para veículos e mais de 2,3 milhões de residências seguradas, deu partida na Oxigênio, que conta com a parceria da Plug and Play Tech Center, uma das maiores aceleradoras do Vale do Silício. A ideia surgiu em abril, em uma reunião de estratégia da empresa, que viu que sua criação era uma forma de prospectar novas soluções semi prontas ou já existentes no mercado, ampliando a busca por inovação. “Temos 65 produtos diferentes no portfólio e uma necessidade de ter soluções novas sempre e a aceleradora é uma forma de inovar fora da estrutura interna”, diz o diretor da Oxigênio Aceleradora, Ítalo Flammia.
Para ele, buscar inovações radicais exige pensar de uma outra maneira. “Os processos internos de uma empresa grande criam dificuldades para criar inovações, há os paradigmas corporativos internos. A aceleradora passa a ser provocadora de uma nova cultura interna, em que os nossos 15 mil colaboradores passam a pensar como uma empresa nascente e passam a agir como empreendedores, esse é o subproduto da aceleradora”, afirma. As primeiras selecionadas deverão ser anunciadas em dezembro, e os recursos deverão ir para o caixa dessas empresas em janeiro de 2016. A ideia é apoiar dez startups por ano, chegando a 40 investidas em três anos. O foco do projeto são empresas de tecnologia.
Cada startup receberá US$ 150 mil, sendo US$ 50 mil em aporte. Pelo investimento, a Porto Seguro e a Plug and Play Tech Center irão compartilhar a opção de 10% da propriedade das empresas selecionadas. As empresas selecionadas serão aceleradas por três meses no centro de inovação da Oxigênio, em São Paulo. Depois, os empreendedores irão para o Vale do Silício em uma segunda etapa de aceleração, por até três meses, dentro da Plug and Play.
A Intercement, braço da Camargo Corrêa focado na produção de concreto e cimento, criou a Neogera há pouco mais de um ano para apoiar empresas nascentes com ideias inovadoras. Em reuniões para alinhar sua estratégia nos próximos anos, a empresa se viu diante de um desafio: ou ficava sujeita às oscilações do mercado das commodities ou buscava se diferenciar com produtos inovadores e serviços diferenciados aos clientes, o que permitiria margens melhores.
A saída foi criar uma aceleradora, diz Adriano Nunes, diretor de inovação da empresa. “Estamos de olho em capital semente e temos quatro investidas, mas deveremos ter em breve mais duas ou três no nosso portfólio. Estamos na fase de aprendizado do que essa interação pode trazer para grandes empresas”, destaca. Em parceria com a Aceleratech, a Neogera busca investir em companhias que atuam na indústria de construção civil. Um dos desafios, Nunes cita, é que as empresas nascentes têm estruturas pequenas e trabalham com pedidos pequenos. “Uma empresa apoiada pela gente está muito bem vendendo 200 mil toneladas por ano de um produto novo, enquanto nossa empresa vende 40 mil toneladas por dia dos principais produtos, então é preciso vender a ideia da importância dessas estruturas diferentes todos os dias para as equipes, porque é uma mudança de cultura”, afirma.
Segundo ele, o momento atual de desaceleração econômica e queda de vendas tem tornado essa integração mais fácil. “Incentiva a mudar a cultura, porque todos querem vender nesse período mais conturbado e isso faz com que todas as ideias possam ser ouvidas.” Para Beny Rubinstein, presidente da Acelera Partners, quando uma empresa maior trabalha com uma menor é preciso ter metas realistas e fazer com que as duas equipes trabalhem próximas, tentando interagir da melhor forma possível e podendo criar um ambiente livre para que ideias surjam.
Diretor de investimentos da Samsung Ventures, Luis Arbulu, diz que sua área tem interagido cada vez mais com segmentos estratégicos que traçam o futuro do conglomerado coreano, cuja receita supera US$ 150 bilhões, sendo uma das maiores rivais da Apple e da Microsoft. “Todos querem ouvir o que se passa no Vale do Silício, onde estão as tecnologias mais disruptivas, porque as histórias do Facebook e do Google são conhecidas.” Arbulu, no entanto, afirma que o modelo de grandes empresas investirem em aceleradoras tem sido colocado em xeque nos Estados Unidos, com algumas abandonando essa linha de investimentos. “Houve uma bolha, houve muito investimento, muitas empresas aplicando recursos em outras que tinham produtos similares, ou seja, sem muita razão de aplicar os recursos. A Samsung sempre olhou isso de outra maneira, não temos uma iniciativa de aceleradora propriamente dita”, diz o executivo.
Isso não significa que a Samsung Ventures esteja fora desse mundo. Ao contrário a empresa investe capital de risco em empresas orientadas para o futuro em vários setores, em alguns casos em estágios iniciais. “O mundo está em constante transformação, a indústria de software é muito dinâmica, então participar de investimentos em estágios iniciais pode assegurar a perenidade do negócio, por se antecipar às tendências que irão moldar os produtos e a vida das pessoas.” Para Carlos Dapuzzo, sócio da Monashees Capital, a indústria de capital de risco no Brasil ainda está se desenvolvendo, o que fará que em breve grandes empresas nacionais comecem a criar seus fundos para investir em empresas nascentes. Há dez anos, quando se aventurou no segmento, foi taxado de maluco pelos amigos.
Cinco anos depois, o cenário já mudou, com desinvestimentos e grandes gestoras internacionais desembarcando no país. “Isso se combina a outro ponto: o Brasil não tem grande conhecimento de tecnologias disruptivas, isso faz com que o caminho das empresas para apoiar o capital de risco ainda seja incipiente, mas acredito que grandes empresas nacionais irão apostar nesse caminho, gradualmente, ao longo dos próximos anos.”
A opinião também é compartilhada por Carlos Kokron, diretor operacional da Qualcomm Ventures Latam. “Nos últimos seis meses, estamos ouvindo várias empresas do setor de bens de consumo não duráveis, como fabricantes de bebidas e cosméticos, que podem abrir investimentos para venture capital para apoiar fornecedores ou empresas com novas tecnologias. Há ainda shoppings, empresas de mídia, varejo, indústrias. Isso irá acontecer em breve”, aponta. Para ele, a dúvida que o processo traz é qual o desenho que esses fundos terão e quais serão os focos. Em relação à densidade tecnológica, ele ressalta que o Brasil poderá focar em setores em que tem grande competitividade, como o da agricultura de precisão. “O setor agrícola é muito forte.”
Fonte: Valor
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