Por Edison C. Fernandes e Márcia dos Santos Gomes
Esta não é uma conclusão científica, decorrente de uma pesquisa de campo exaustiva, mas, a nossa experiência no atendimento a empresas demonstra que oito entre dez profissionais de departamentos fiscais estão pensando no Bloco K. Os outros dois ou não sabem do que se trata ou estão envolvidos com outras tarefas, deixando para pensar nele mais adiante. A sua importância é proporcional à antecedência dessa preocupação. O Bloco K é a versão eletrônica e atualizada do Livro Registro de Controle da Produção e do Estoque Modelo 3.
As informações do Bloco K, então, são relacionadas ao controle do estoque da empresa. Inicialmente, essas informações se restringirão ao processo produtivo e às quantidades de matéria-prima, insumo, embalagem, produto acabado etc., pois os valores referentes a parte desses itens já estão disponibilizados em outros blocos da EFD ICMS/IPI (bloco H) e da EFD Contribuições. Se o coração da empresa é o caixa, bombeando recursos financeiros para todas as veias e artérias corporativas, o estoque é o cérebro. Pela decisão de comprar barato ou a prazo e vender a prazo ou à vista, o estoque concentra a maior energia estratégica da empresa. Por isso, as “sinapses” que ocorrem no interior do estoque são observadas atentamente pelas normas tributárias.
A visão integrada dessa obrigação contribui para uma eficiente gestão tributária, que tenha por objetivo não desperdiçar recursos Não é por acaso que o controle do estoque é monitorado pelos principais tributos cobrados no Brasil. Desde o ICMS e o IPI, até o IRPJ e a CSLL, passando pela Contribuição ao PIS e pela Cofins, as movimentações do estoque são importantes para determinar a base de cálculo e o montante devido a título desses tributos. Em sendo assim, o Bloco K não pode e não deve ser visto como uma “mera obrigação acessória” a ser preenchida de maneira a evitar multas administrativas, mas demanda uma visão integrada.
A integração mencionada não se restringe à legislação tributária e ao inestimável sigilo industrial, conquanto sejam pontos de extrema relevância, mas envolve o direito contábil, o direito societário, e, até, o direito dos contratos e o direito do trabalho. Os sócios olham para o estoque à espera do lucro que remunerará o seu capital; os clientes se preocupam com o estoque, esperando que a venda ou a prestação de serviço seja efetuada; os fornecedores veem no estoque oportunidade de negócio; os trabalhadores têm no estoque uma demonstração da garantia do seu emprego e da sua remuneração; e, obviamente, a administração tributária também acompanha a movimentação do estoque para fins de arrecadação e combate à sonegação.
Todos esses interesses se inter-relacionam e, por isso, constam das demonstrações contábeis. Encontram-se no estoque as informações necessárias para a formação de preço, quer de produto, de mercadoria ou de serviço, o que implicará a apuração de lucro ou de prejuízo. Daí a importância para os tributos não cumulativos (IPI, ICMS, Contribuição ao PIS e Cofins), porque os valores devidos nas etapas anteriores da cadeia comercial não comporão o custo do produto, da mercadoria e, eventualmente, do serviço, em razão de serem créditos fiscais (valor recuperável) para a empresa. Esse efeito tributário explica o controle referente a esses tributos.
Por falar em custo, o estoque também representa a principal dedução permitida na apuração dos tributos sobre o lucro (IRPJ e CSLL). Dependendo da operação realizada, diversos controles fiscais podem ser exigidos, como acontece com os preços de transferências nas transações internacionais com empresas vinculadas, ou seja, pertencentes ao mesmo grupo econômico ou com relação de exclusividade. Esse efeito tributário amplia a importância do estoque. Por tudo isso, a seriedade no preenchimento do Bloco K não pode ser orientada tão somente para evitar a multa aplicada por informação incorreta embora essa penalidade deva ser considerada ou restrita a minimizar o vazamento de informações do segredo industrial.
A visão integrada dessa obrigação acessória contribui para uma eficiente gestão tributária, que tenha por objetivo não desperdiçar recursos, inicialmente, com o pagamento desnecessário de tributos e multas administrativas, mas, também, com o desenvolvimento adequado das operações empresariais (compra, venda e prestação de serviços). A condução das questões relacionadas ao Bloco K exige uma verdadeira governança tributária. Edison Carlos Fernandes e Márcia dos Santos Gomes são sócios da área tributária do Fernandes, Figueiredo, Françoso, Petros Advogados Este artigo reflete as opiniões do autor, e não do jornal Valor Econômico. O jornal não se responsabiliza e nem pode ser responsabilizado pelas informações acima ou por prejuízos de qualquer natureza em decorrência do uso dessas informações
Fonte: Valor