Edcarmen Ferreira da Silva, de 25 anos, mora no bairro de Apipucos, no Recife. Foi criada usando fraldas de pano. Lembra ainda hoje que, quando saía, a mãe fazia um reforço na “calça enxuta”, muito utilizada até o fim do século passado, e que tinha o poder de deixar o bebê sequinho. Edcarmen também recorreu às fraldas tradicionais para sua primeira filha, Beatriz Maria, de 4 anos.
— Naquela época, eu não tinha emprego. Dependia apenas do marido. E as fraldas descartáveis eram muito caras. Usava as de pano, e só apelava para as outras quando precisava sair com o bebê — conta a pernambucana.
— São muito mais práticas. Não perdemos mais tempo na beira do tanque de lavar roupa — afirma Maria do Carmo Ferreira, mãe de Edcarmen e que atualmente ajuda na criação das netas.
O mercado de fraldas descartáveis movimentou US$ 2,4 bilhões em vendas em 2013, segundo dados da Associação Brasileira da Indústria de Higiene Pessoal, Perfumaria e Cosméticos (Abihpec). Em cinco anos, acumula 70% de expansão em valor. É desempenho superior ao registrado na América Latina, que foi de 50%, com US$ 6,7 bilhões em vendas no ano passado, e no mundo, com alta de 30%, totalizando US$ 39 bilhões.
— A demanda subiu e estimulou maior concorrência no setor. Em duas décadas, o preço médio caiu de US$ 1 por fralda para US$ 0,10. O Brasil já é o terceiro maior consumidor de fraldas descartáveis do mundo, ficando atrás apenas dos Estados Unidos (que tem vendas de US$ 4,4 bilhões por ano) e da China (US$ 4 bilhões). Mas há espaço para crescer — explica João Carlos Basílio, presidente da Abihpec.
No Nordeste, volume de vendas cresce 33%
A atendente Edcarmen compra oito pacotes de fraldas descartáveis por mês, destinando de R$100 a R$150 do orçamento para garantir o conforto da caçula. Segundo analistas, o processo de sofisticação de hábitos de consumo representa um segundo momento no ganho de renda e consequente aumento da classe média. A mudança ocorre em várias categorias, explica Giovanna Fischer, diretora de contas da Kantar Worldpanel, incluindo a de fraldas descartáveis:
— Primeiro, houve o acesso à categoria. Agora, verificamos a sofisticação desse consumo. Este ano, o consumo de fraldas descartáveis no país cresceu 14% em volume, na comparação com 2013. Em valor, a expansão é de quase 29%. Isso mostra aumento no que se gasta com o produto. O foco sai do preço e vai para benefício.
No Nordeste, o movimento é ainda mais evidente. Na região, o consumo de fraldas descartáveis subiu 13,6% em volume, perto da taxa nacional. Já em valor, o aumento foi de 33%.
— O Nordeste ainda tem muito potencial de crescimento, sobretudo em valor. Lá, o preço médio do pacote é de R$ 11,78, contra R$ 15,34 no Brasil — pondera Giovanna.
Para Ana Hubert, gerente sênior e especialista de varejo e consumo na PwC Brasil, o consumidor está cada dia mais exigente.
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— Com o maior acesso à informação, ele compara marcas e preços, fazendo escolhas que garantam o melhor benefício — diz Ana.
A indústria está atenta aos passos do consumidor. E reforça investimentos em inovação e no aumento da capacidade de produção.
A Pampers, marca de fraldas infantis da P&G, quase dobrou as vendas da linha intermediária Total Comfort nos últimos 18 meses, diz o diretor Leonardo Romero. Em igual período, a linha básica Supersec perdeu 25% em vendas. Na outra ponta, a Premium Care, top da marca, também registrou queda, mostrando que o freio na economia deste ano está ajustando o consumo também na classe A.
— Isso mostra uma clara migração de consumo. As pessoas estão em busca de produtos de maior qualidade, com preço adequado. Quando a economia do país começou a melhorar, houve migração das marcas muito baratas. Surgiram novas categorias de fraldas — diz Romero.
A P&G está investindo R$ 1 bilhão na ampliação do parque fabril no Brasil. O pacote inclui expansão da unidade de Louveira (SP), onde são produzidas as fraldas Pampers, que vai dobrar de tamanho em área construída.
A especialista da PwC explica que há um componente social na escolha do consumidor por fraldas melhores:
— Hoje, a mulher trabalha fora e tem menos tempo em casa. Com a fralda descartável, ela deixa de lavar fraldas à mão, economizando tempo. Com um produto melhor, a criança dorme a noite inteira, permitindo que a mãe e a família descansem.
A Hypermarcas tira de suas fraldas um terço dos negócios da divisão de consumo da empresa. Um par de anos atrás, a companhia ajustou o portfólio de fraldas infantis — a empresa atua também no segmento de adultos —, descontinuando marcas que adquiriu para atuar no segmento econômico. Ficou com apenas três: Pom Pom (top), Disney Cremer (intermediário) e Sapeka (básica). Para crescer, houve ainda reorganização fabril. A produção de fraldas ficou concentrada em Goiás. Houve também investimento no centro de distribuição, para reduzir custos de transporte e logística.
— As fraldas de categoria mais econômica perderam representatividade no mercado. O consumo da nova classe média mudou. As pessoas aprenderam a valorizar produtos de qualidade — conta Nicolas Fischer, presidente da área de consumo da Hypermarcas.
Na Kimberley-Clark, que atua no mercado infantil com a marca Huggies, as fraldas já equivalem a 40% dos negócios da companhia. Com crescimento de dois dígitos nos últimos dois anos no país, a categoria bateu 25% de aumento em vendas no Nordeste, destaca o diretor de operações Sérgio Montanha. No ano passado, a empresa inaugurou fábrica em Camaçari, na Bahia. O projeto de R$ 100 milhões tem 60% da produção concentrados em fraldas. Em um ano, a unidade baiana já representa 15% do faturamento no Brasil.
A nova fábrica da Kimberley-Clark será vizinha do complexo acrílico que a Basf abre até o fim do ano também em Camaçari. Sinal de que também a indústria de insumos tem os olhos voltados para a expansão no mercado de fraldas descartáveis no Brasil.
Basf vai fabricar matéria-prima no Brasil
Com investimento de € 500 milhões, a Basf vai produzir insumos para uma série de setores, incluindo o de higiene, mais precisamente fraldas. Hoje, não há similar nacional para essa matéria-prima, que é 100% importada.
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— Será o sexto complexo acrílico da Basf no mundo, primeiro na América do Sul. Nossa estimativa é colaborar com uma redução de US$ 300 milhões na balança comercial, combinando substituição de importações e alta em exportações — explica Rui Goerck, vice-presidente de Químicos da Basf para a América do Sul, que acredita que a médio ou longo prazo a produção nacional deve resultar em barateamento das fraldas.
O setor de celulose é outro antenado com o impacto do ganho de renda no consumo de produtos de higiene. A Eldorado Brasil tem 45% do que produz usado como insumo para a fabricação de tissues, os papéis absorventes de alta qualidade, usados na produção de lenços de papel finos, guardanapos ou papel higiênico de folhas dupla ou tripla.
— O ganho de renda elevou o consumo de fraldas e tissues. A demanda pela matéria-prima cresce de 10% a 12 % ao ano no Brasil. Tissues é a categoria de maior demanda no mundo para celulose — afirma Luis Felli, diretor comercial e de logística da Eldorado Brasil.
Fonte: O Globo