[:pt]Confusão fiscal gera 190 mil cobranças indevidas na Sefaz[:]

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Confusão fiscal e má fama de Mato Grosso afastam empreendedores e provocam prejuízos aos empresários mato-grossenses

Atualmente cerca de 190 mil processos eletrônicos de cobranças indevidas estão em análise na Secretaria de Fazenda de Mato Grosso (Sefaz-MT). A informação é do Conselho Regional de Contabilidade (CRC). Os processos são em sua maioria reclamações de contabilistas e empresários que tiveram de pagar impostos indevidamente cobrados, ou multas aplicadas de forma errônea.

A situação caótica da realidade tributária de Mato Grosso não é novidade para ninguém e o assunto já foi abordado diversas vezes pelo Jornal Circuito Mato Grosso. Na edição 539 o jornal recebeu uma denúncia quando um vendedor, anunciando no site do Mercado Livre (site de e-commerce) se recusou a vender para compradores de Mato Grosso. A justificativa para não entregar o produto no estado veio em uma linha: “Por causa de questões tributárias”. A resposta resume o descontentamento e o prejuízo que a burocracia das leis fazendárias está provocando no Estado.

Desta vez a presidente do Conselho de Contabilidade de Mato Grosso, Silvia Mara Leite Cavalcante relatou que, apesar dos decretos terem diminuído, ainda há muita cobrança indevida realizada pelo governo – o que afasta qualquer empresário de investir no Estado. “Uma instabilidade tributária horrível! O que isso provoca: as médias e grandes empresas não querem vir para cá, pois têm medo. Porque elas têm planejamento tributário, ou seja, elas traçam os orçamentos para pagar as tributações ao longo do ano. Por isso as empresas querem saber o que vão ter que pagar, antes de pagar. Com a instabilidade do passado e a fama de Mato Grosso, as portas se fecharam”, disse a representante.

Silvia Mara também explicou que as cobranças indevidas da Sefaz geraram, somente neste ano, quase 200 mil processos no órgão. “O número no ano passado foi de 260 mil de recursos por cobranças indevidas e todo gênero de reclamação. Hoje está em 190 mil processos. Ambos os números estão altíssimos para um estado como o nosso. Alguma coisa está seriamente errada, esses empresários não estão entrando com processos a toa. É preciso que eles sejam ressarcidos e que essas cobranças indevidas cessem”, pontuou a presidente.

A situação é critica e já foi inúmeras vezes abordada com o secretariado do Governo. “Nós reclamamos, pois tivemos mais abertura para conversar com o secretário Paulo Brustollin e sua equipe. O pessoal da contabilidade sempre está sendo incisivo e cobrando deles. Falei no fórum de regularização fiscal sobre essas demandas. Uma informação que nós damos para um cliente este mês, pode não ser a mesma do mês que vem, enfim! É o caos instaurado. Ele (o secretário) me disse que o Governo ia firmar um acordo com a Fundação Getúlio Vargas (FGV) para simplificar e descomplicar nossa legislação tributária”..

A promessa já havia sido dada durante uma entrevista com o jornal Circuito Mato Grosso em junho na edição 541. À época o secretário Paulo Brustolin disse que grande parte das dificuldades enfrentadas pelos contribuintes de Mato Grosso seriam resolvidas até o mês de novembro. “Esse esforço conjunto para facilitar o acesso do contribuinte à legislação mato-grossense teve início no mês de março e tem o prazo até novembro para ser concluído. Isso é uma das metas tanto minha quanto do secretário de Desenvolvimento Econômico, Seneri Paludo’, argumentou o secretário da Sefaz.

Afastando novos empreendimentos

Por conta da instabilidade tributária o Estado sofre de uma má fama que já o acompanha há quase uma década. Para a presidente do CRC isso não será fácil de desfazer, o que, na prática, traz consequências nefastas para Mato Grosso. “Os negócios não vieram para cá, a não ser aqueles que tinham benefícios fiscais. Porém até as empresas que recebiam benefícios tiveram que vir para o Estado de forma arriscada, pois hoje elas poderiam receber os incentivos e perdê-los amanhã, já que o Estado dava com uma das mãos e tirava com as duas mais tarde”.

Como profissional da contabilidade, Silvia Mara disse que não recomenda Mato Grosso a nenhum cliente do Brasil. “E por isso, eu como contadora, nem estimulo donos de empresas a virem para cá. Eu estava esses dias falando: Não venham para cá, aqui está um horror! Pois se recomendarmos que venham, podemos ser até penalizados, por passar uma informação errada”, revelou.

Questionada mais profundamente sobre suas experiências com o Estado, a contadora desabafou e explicou a gravidade do problema. “Para tentar ilustrar, é igual feira de negócios: vinham produtos de amostra grátis e o governo queria tributar. Vinham empreendedores demostrar serviços especializados e o governo queria tributar, multar, travar as contas do empresário. Já tive cliente de outro estado que disse para mim que o único lugar que eles nunca mais pisarão é o nosso estado”, argumentou Silvia.

Por fim a presidente esclarece que a legislação tributária de Mato Grosso é uma ‘colcha de retalhos’. “Na verdade nem é um código, pois foi aprovado unicamente pelo Estado, na realidade é um regulamento. E o regulamento do ICMS (Imposto Sobre Circulação de Mercadorias) de Mato Grosso tem mais de mil artigos, fora os entendimentos que ainda são contrários e dúbios. Além do regulamento, tem resoluções e muitas portarias. A pessoa precisa ficar só por conta disso para entender do assunto”, concluiu.

Luz no fim do túnel

A solução para a reforma tributária no Estado seria simplificar a leis e parar de tributar por atividade (Cnae) . “Não precisa disso. Precisamos de um negócio nivelado, simples e sabermos o que temos que pagar antes. E não como acontece hoje, que depois que passa precisamos questionar o Estado por pagarmos impostos a mais, temendo multas”, propôs.

Abordado em uma entrevista para o site do CircuitoMT, a professora de Ciências Contábeis da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT) Giseli Alves Silvente, especialista na legislação fazendária estadual explicou essas alternativas para melhorar a interação entre empresariado e governo. “Os contribuintes não são sonegadores. Eles são pessoas comuns que constituem empresa e precisam pagar seus tributos, tirar algum lucro para reinvestir e sobreviver. Se não existisse o contribuinte, não existiria o Estado. São pessoas sérias e precisam ter acesso às informações da Sefaz. Às vezes ele erra não porque quer sonegar, mas porque a legislação é obtusa. Quando ele erra nesse cálculo, isso gera ônus para ele, pois além de ter que pagar a carga tributária – que já é alta – ele precisará arcar com multas e penalidades previstas na lei. Nesse caso, o lucro dele vai embora e às vezes tem até prejuízo”, disse a especialista.

Confusão interna

A situação que foi abordada em maio, por uma reportagem especial do Circuito Mato Grosso, ainda persiste. Apesar de o secretário Paulo Brustolin ter prometido que até o final de outubro teria solucionado grande parte das demandas do empresariado, ainda há muita confusão na secretaria.

Os plantonistas fiscais que trabalham na ‘linha de frente’ e que precisam esclarecer as mazelas da legislação para os empresários, se confundem e não entendem todas as interpretações do regulamento. “Quantas vezes eu presenciei a plantonista da Sefaz se confundir com o emaranhado de decretos e passar uma informação imprecisa!! E não é culpa só dela, pois não foi ela que criou decreto. Mas também não adianta criar a informação e não querer socializar. Não resolve tentar fazer as empresas errarem para poder autuar, multar e arrecadar dinheiro com as penalizações. É muito melhor as empresas pagarem os impostos para ter mais arrecadação, do que ficar só trabalhando com multas, que os empresários não conseguem pagar, quebram e não quitam nem a multa, nem o principal”, concluiu.

Cobranças ilegais

Com 190 mil processos para análise do governo, algumas dessas cobranças podem ser ilegais como aponta o deputado Emanuel Pinheiro (PR) em entrevista ao Circuito Mato Grosso. Cobranças essas que podem ter provocado R$ 32 milhões em cobranças indevidas. Isso porque a portaria 285/2014 de Silval Babosa (PMDB) que previa descontos e parcelamentos para o empresariado, em 2015, (pois respeitava o princípio da anterioridade) – foi revogado pela gestão de Pedro Taques (PSDB) por meio da portaria 23/2015. “A situação foi abordada por mim no início do ano quando o governo atualizou a Unidades Padrão Fiscal (UPF – uma medida usada pelo governo para cobrança de penalizações) sem avaliar o principio da anterioridade. Os empresários que haviam recebido os descontos já tinham se programado para este ano. Contudo vem um novo decreto e retira esses benefícios e, pior ainda, aumenta a UPF que onerou ainda mais as multas aplicadas”, disse o deputado.

Para o parlamentar, as cobranças dos descontos que já haviam sido aprovados no governo anterior são arbitrárias. “Da revogação da lei no dia primeiro de janeiro, sem respeitar o princípio da anterioridade, até data da aprovação dessa portaria em junho deste ano – houve uma cobrança maior. Ou seja, o Governo sem querer, ou querendo, revogou todos os descontos conquistados pela portaria de 285/2014 que já haviam sido aprovados. Então de fevereiro a junho (data da aprovação da nova portaria 23/2015), aqueles que tinham sido beneficiados pelos descontos pagaram em média – em contas feitas por um levantamento extraoficial da minha equipe – R$ 8 milhões por mês indevidamente. Se houve ‘patuscasda’ ou não, aconteceu aí um equivoco muito grande da equipe governamental e que possivelmente redundou num prejuízo muito grande para os contribuintes de Mato Grosso”, explicou Emanuel.

Além disso, conforme relembrou o deputado, na época houve grande movimentação na Assembleia para a aprovação da atualização da UPF. “Eu sugeri uma emenda pedindo que toda cobrança indevida feita pelo governo fosse restituída para o contribuinte de forma imediata e por ofício” disse o parlamentar.

Em uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), a revogação de descontos fiscais dados pelos governos foi vetada. Segundo trecho da decisão “toda alteração do critério quantitativo da regra matriz de incidência fiscal, deveria ser entendida como majoração do tributo. Assim, tanto o aumento de alíquota, quanto a redução de benefícios, apontariam para o mesmo resultado, ou seja, o agravamento do encargo”.

A jurisprudência do STF foi aprovada pela maioria dos ministros que compõem a 1ª Turma da Suprema corte, quando eles julgavam o mérito de Recurso Extraordinário 564225, onde foi decidido que se configura aumento indireto de tributo a redução do benefício fiscal, sendo que neste caso os governos devem aplicar a determinação no ano seguinte e nunca no corrente ano da publicação.

Outro lado

Apesar de várias tentativas de contato da equipe do Jornal Circuito Mato Grosso, por duas semanas (período de apuração desta matéria), o secretário de Fazenda, Paulo Brustolin, não pôde nos atender. Segundo sua assessoria de imprensa, o secretário não teve tempo durante esse período e em breve marcaria uma coletiva de imprensa para tratar do assunto.

Questionado sobre os números de processos de restituição de indébitos a assessoria de imprensa da Sefaz disse, por meio de nota, que o levantamento dessa informação é feito por uma equipe interna da secretaria e que o prazo seria de, no mínimo, 10 dias.

 Fonte: Circuito Mato-Grosso

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