Por Gilberto Luiz do Amaral
O sistema tributário brasileiro já é o mais complexo e caro do mundo, em virtude da quantidade de tributos, normas que regem o sistema tributário, burocracia e por último o efeito “cascata” dos impostos e contribuições. Isto faz com que o cidadão trabalhe mais de 150 dias por ano somente para pagar tributos e resulta numa carga tributária imensa, que ultrapassa a 36% do Produto Interno Bruto (PIB) e que cresce constantemente nos últimos 15 anos.
Os governos exigem dos cidadãos o pagamento de 63 tributos, classificados como impostos, taxas e contribuições, que atingem a todos os contribuintes, seja de maneira direta ou indireta. Além disso, há uma quantidade enorme de leis, medidas provisórias, decretos, portarias, instruções normativas e outros dispositivos que atormentam a vida do brasileiro, trazendo constante insegurança sobre quais as normas que efetivamente estão em vigor. As obrigações acessórias ou a burocracia tributária tornam este sistema por demais perverso, principalmente para as empresas, que gastam cerca de 1,5% de seu faturamento anual somente para manter estruturas de pessoal, equipamento, softwares e consultorias para tentar ficar em dia com o recolhimento dos tributos. Aumentar tributos é o caminho mais fácil e preferido dos governantes para atenuar o desequilíbrio das contas públicas E, ainda, a complexidade do sistema de tributação é agravada pela multiincidência tributária, ou seja, o chamado efeito “cascata” dos impostos e contribuições, no qual o tributo incide sobre ele mesmo nas várias etapas de produção e circulação de mercadorias e serviços, ao mesmo tempo em que um tributo pode servir como base de cálculo de outro tributo.
Esta característica é típica do sistema brasileiro, onde existe o cálculo por dentro dos principais tributos, ou seja o montante, por exemplo, do ICMS é utilizado para inflar a sua própria base de cálculo ou majorar a base de cálculo do PIS e da Cofins. O aumento da tributação pode se dar de várias maneiras, seja pelo aumento das alíquotas, pela modificação da base de cálculo ou sistema de incidência ou ainda através da não correção, por exemplo, da tabela do Imposto de Renda na fonte. A corrupção também é uma forma de aumentar a carga tributária. De um lado, o sobrepreço eleva indevidamente o custo dos serviços públicos, exigindo que o cidadão pague mais tributos para que a obra ou bem público seja realizado. De outro lado, o superfaturamento faz com que os agentes públicos desprezem os controles gerenciais, prejudicando e muitas vezes impedindo a transparência dos números, permitindo a utilização da “contabilidade criativa” ou falsificação dos resultados.
Neste momento em que o governo federal e os governos estaduais promovem medidas de ajuste fiscal, principalmente de aumento de tributos, já que a diminuição nos gastos públicos se apresenta insuficiente, a discussão sobre a eficácia desta costumeira política econômica ganha relevância.
Recentemente o governo federal promoveu uma série de aumento de tributos: Cide combustíveis, PIS/Cofins Importação, IOF, os quais repercutem em todas as cadeias produtivas e de consumo. Como resultado, o preço de mercadorias e serviços já aumentaram e irão aumentar ainda mais. Também, houve o corte de benefícios fiscais, como desoneração da folha, IPI do setor automotivo, programas de incentivo às exportações. E, acena ainda com novas medidas de elevação tributária. No âmbito dos governos estaduais, ocorreu o aumento da Margem de Valor Agregado (MVA) da substituição tributária do ICMS, majoração da alíquota de ICMS no Paraná, elevação do IPVA em alguns Estados, dentre outras medidas. Também vários municípios aumentaram o IPTU. Para agravar a situação, o governo federal prepara uma malfada medida para tungar o bolso dos brasileiros, principalmente das empresas prestadoras de serviços. Sob o argumento de que irá simplificar o sistema tributário, prepara a unificação das contribuições sociais PIS e Cofins, acabando com o sistema cumulativo para as principais atividades e majorando as alíquotas.
Há três anos coordeno um estudo no Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação (IBPT), analisando a proposta de fusão das citadas contribuições e seus reflexos no custo tributário e no preço final dos serviços. Conforme amplamente divulgado pela imprensa, com os dados da arrecadação até 2013, se a medida fosse implementada resultaria num aumento de custo de mais de R$ 35 bilhões por ano para as empresas. O regime da não cumulatividade do PIS foi instituído em 2002 e da Cofins a partir de 2004. Isto resultou num estrondoso aumento da arrecadação dessas contribuições, de mais de 1 ponto porcentual sobre PIB por ano. Ou seja, são mais de R$ 50 bilhões de arrecadação extra todos os anos. Isto porque as alíquotas foram calibradas para cima, passando de 0,65% para 1,65% no caso do PIS e de 3% para 7,6% referente à Cofins. Apesar da promessa de revisão destas alíquotas após um período de avaliação de dois anos, nada houve para atenuar o impacto tributário.
Enquanto milhões de brasileiros, entre trabalhadores, empresários e aposentados têm que administrar seus orçamentos domésticos e empresariais cortando urgentemente despesas para mantêlos equilibrados, já que seus salários, receitas e proventos estão em queda por causa da difícil situação econômica que o país atravessa, além de enfrentar o aumento dos impostos, combustível, energia e juros, os governantes jogam toda a conta do desvario fiscal para o contribuinte pagar. O aumento dos tributos é o caminho mais fácil e preferido pelos governantes para atenuar o desequilíbrio das contas públicas. Entretanto, é caro e dolorido para quem paga a conta: o contribuinte brasileiro.
Caro porque aumenta ainda mais a estrondosa carga tributária; e dolorido porque agrava a injustiça tributária vigente no país, ao mesmo tempo em que perpetua a incompetência e a má gestão dos recursos públicos. Gilberto Luiz do Amaral é advogado tributarista, contador, professor de pósgraduação e aperfeiçoamento em direito, governança e planejamento tributário, presidente do conselho superior e coordenador de estudos do Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação (IBPT), sócio do Amaral, Yazbek Advogados Este artigo reflete as opiniões do autor, e não do jornal Valor Econômico. O jornal não se responsabiliza e nem pode ser responsabilizado pelas informações acima ou por prejuízos de qualquer natureza em decorrência do uso dessas informações
Fonte: Valor