Economia global patina em meio a um cenário de riscos


O pulso da economia mundial bate mais devagar este ano, em relação a 2013, e ela ainda corre o risco de um desempenho medíocre por bastante tempo, adverte o Fundo Monetário Internacional em documentos prévios à sua reunião anual, que começa no fim de semana. Os riscos não mudaram, mas a perspectiva de crescimento global foi rebaixada para 3,3% em 2014 (-0,4%) e 3,8% para o próximo ano. Das grandes economias, o Brasil tem uma das piores performances, só melhor que a da Rússia. O FMI reduziu em 1 ponto a previsão de expansão, para 0,3% e 1,4% em 2015 – ambas estimativas mais otimistas que a dos analistas domésticos.
Com exceção dos riscos geopolíticos, que aumentaram no Leste europeu e no Oriente Médio, os perigos conhecidos continuam presentes no horizonte. Os EUA, cujo ritmo de crescimento mostra-se firme, pode ter de elevar mais rapidamente que o previsto as taxas de juros, expectativa não compartilhada pelos investidores americanos. Mudanças de direção nos mercados financeiros poderão ser altamente desestabilizadoras, porque ocorreriam em um contexto de alta alavancagem, grande apetite por riscos em busca de retornos e precificação inadequada dos ativos. A desaceleração controlada chinesa continua a ser um desafio, ameaçada pela enorme bolha de endividamento e amparada por um sistema bancário paralelo precário que depende da manutenção de alta liquidez.
Não menos importante, há, pelas estimativas do Fundo, 30% de chance de a zona do euro enfrentar um período deflacionário, que agravaria o quadro de enormes dívidas privadas e de governos. Mais que deflação, a economia do bloco monetário tem 40% de probabilidade de entrar em recessão. Além disso, os países emergentes estão crescendo agora abaixo de seu potencial e não por motivos conjunturais e sim estruturais.
Há poucos fatores positivos para a economia global. Um deles é que após a forte redução dos déficits públicos, especialmente na Europa, a consolidação fiscal global seguirá agora passo moderado, de 0,5% do PIB, ante mais do dobro nos anos anteriores. Esse é um dado importante diante da fraqueza dos investimentos, mesmo nos Estados Unidos, e do crédito, mais na Europa. Com expectativa de baixo crescimento prolongado, o Fundo vê folga para que os investimentos públicos sejam ampliados e sirvam como um ponto de apoio para dar mais vigor a economias desenvolvidas estagnadas e aos países emergentes, dependendo da situação de suas contas públicas.
Não é o caso do Brasil, sugerem as estatísticas do FMI. O país tem a maior dívida bruta em relação ao PIB do mundo emergente: 65,5% – pelos cálculos do governo brasileiro, 57,2%. A média das economias do G-20 é de 41,4% do PIB e da América Latina, 51,3%. Previsões de longo prazo do Fundo, menos confiáveis, indicam que pouca coisa mudará nos próximos 5 anos. Em 2019, essa relação será ainda de 64% do PIB. Isso se deve a um esforço fiscal primário menor que no passado. A meta oficial do governo, de 1,9% para o ano, não será cumprida. O FMI projeta um superávit primário de 1,3% do PIB, que crescerá para 2% em 2015 e assim se manterá até 2019.
Os gastos públicos (com Estados e municípios) estão perto do recorde de 42,1% do PIB em 2014 e recuarão pouco, a 40,6%, ao fim de cinco anos. No caso do governo federal, o balanço fiscal ciclicamente ajustado em relação ao PIB potencial aponta que a política fiscal foi claramente expansionista depois de 2011 e só se moveu para perto da neutralidade em 2014, após o déficit ter atingir o ponto mais alto desde 2006, de 3,6% do PIB (em 2013, foi de 3,5%).
A desaceleração foi mais pronunciada na América Latina, onde o Brasil tem grande peso. O desempenho brasileiro apenas superou o da Argentina e Venezuela, ambos em recessão. Parte dos motivos são externos, como a queda da demanda por commodities, especialmente da China. No caso brasileiro, o FMI apontou motivos internos óbvios: queda dos investimentos, perda de confiança dos empresários, política monetária mais apertada etc. Para sair disso, o Brasil terá de fazer as reformas do cardápio de sempre, porque no curto prazo não poderá contar com impulsos externos relevantes, seja do crescimento relevante dos países ricos, seja das exportações. O FMI projeta quedas de 4,1% e 7,9% nos alimentos este ano e em 2015, respectivamente, e de 7,5% e 1,5% nos metais.
Fonte: Valor Econômico


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