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MARCELO LEITE
DE SÃO PAULO
26/11/2015 02h00
Nem todos os economistas do Brasil têm olhos só para a crise do governo Dilma Rousseff. Alguns se preocupam também com a mudança do clima, tema da Conferência de Paris que começa segunda-feira (30), e perguntam: o que aconteceria se o país adotasse um imposto sobre o carbono?
A resposta se acha no primeiro estudo produzido pelo Instituto Escolhas, “Taxação sobre Carbono e Correção de Distorções Tributárias: Impactos Econômicos, Sociais, Ambientais no Contexto Brasileiro”, que foi lançado na última terça-feira (24).
O estudo contou com a supervisão do economista Bernard Appy. Membro do conselho científico do instituto, o ex-secretário-executivo e ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda no governo Lula (2003-2009) foi quem propôs o tema inaugural.
Nações tão díspares como Reino Unido, África do Sul, México e Japão estão adotando a via tributária para pôr um preço nas emissões de carbono (principalmente CO, o mais comum dos gases do efeito estufa). O objetivo é desestimular a queima de combustíveis fósseis nos setores de energia e transportes, maiores fontes de poluição climática no mundo.
EFEITO SOBRE O PIB
Se fosse apenas mais um imposto, a taxação do carbono –na média do que se pratica no exterior, US$ 10 por tonelada emitida de CO (dióxido de carbono)– tiraria quase 0,2 ponto percentual do crescimento do PIB brasileiro. Se a alíquota do novo imposto fosse de US$ 50 por tonelada de CO, a queda seria de quase um ponto percentual do PIB. Como ele já cai sozinho para trás, seria mais um tiro no pé.
Haveria também impacto sobre um universo de 99.560 postos de trabalho: queda de 0,2 ponto percentual no caso da primeira alíquota e de um ponto, no da segunda.
Por outro lado, as emissões caem apenas 1,2 milhão e 6 milhões de toneladas anuais, respectivamente.
“É importante ressaltar que os efeitos aqui analisados são de curto prazo”, diz o estudo, “referindo-se apenas à redução na demanda por produtos intensivos em combustíveis fósseis e não considerando mudanças tecnológicas e/ou mudança de combustíveis, como, por exemplo, de gasolina para etanol, cujo impacto tende a ser muito mais relevante.”
Só que a premissa do estudo nunca foi a de aumentar a arrecadação, e, sim, investigar o efeito de uma única cajadada para matar dois coelhos: introduzir um imposto moderno, já adotado em duas dezenas de países, para compensar a queda de receita que resultaria da melhora da qualidade de um tributo cheio de distorções como o PIS-Cofins.
“Os impactos de tal imposto [sobre carbono emitido com combustíveis fósseis] sobre a competitividade das empresas são os mais diversos”, diz o sumário executivo do trabalho.
“Idealmente, espera-se um efeito positivo sobre o mercado, pois a taxação induz empresas a adotar práticas inovadoras, limpas e mais eficientes, tendendo a excluir a parcela das empresas ineficientes e relativamente mais poluidoras.”
VALOR AGREGADO
O primeiro defeito do PIS-Cofins é a complicação. Há dois regimes em vigor, dependendo do tipo de empresa. O cumulativo tem alíquota de 3,65% sobre o faturamento, e as empresas não se apropriam de qualquer crédito, mas têm a competitividade de seus produtos prejudicada.
No regime não cumulativo, a alíquota é de 9,25%, e as firmas têm direito a crédito sobre os insumos adquiridos. Mas, para a Receita Federal, só geram créditos os insumos fisicamente incorporados ao produto.
Na prática, abre-se um enorme contencioso entre empresas e fisco sobre o que deve ser considerado insumo, ou não.
Por causa dos vários defeitos do PIS-Cofins, o imposto se acumula ao longo da cadeia produtiva –o tributo pago numa etapa não é recuperado como crédito na etapa seguinte. A consequência é a perda de competitividade da produção nacional e uma organização ineficiente da estrutura produtiva do país.
Além disso, a legislação é cheia de regimes especiais, que tornam esse tributo muito complexo. As normas do PIS-Cofins, diz Appy, somam mais de 1.800 páginas. “É um inferno.”
Na hipótese simulada pelo estudo do Escolhas, a simplificação tornaria esse tributo mais parecido com um imposto sobre valor agregado (IVA), não cumulativo.
A alíquota seria de 6,6%, uniforme para todos os bens e serviços.
O cálculo do efeito da redução da cumulatividade apontou que a arrecadação do PIS-Cofins perderia R$ 37,4 bilhões, de um total de R$ 208 bilhões (a preços de 2011).
O estudo utilizou uma matriz insumo-produto da economia brasileira, com dados do Sistema de Contas Nacionais e do Balanço Energético Nacional, ambos de 2011.
IMPOSTO NEUTRO
No cenário esmiuçado pelo estudo, o imposto sobre carbono entraria com a missão de compensar essa quebra de receita. Em outras palavras, nasceria um imposto neutro em termos de arrecadação, mas para isso a alíquota teria de ser de US$ 36 por tonelada de CO.
De acordo com as projeções do Instituto Escolhas, a compensação não resultaria num jogo de soma zero, mas em saldo positivo.
Não só não haveria ameaça ao equilíbrio fiscal como o aperfeiçoamento do PIS-Cofins favoreceria os preços relativos de vários produtos que o Brasil exporta, com aumento da competitividade externa e discreto incremento no PIB (0,47 ponto percentual).
“Se a introdução do imposto sobre emissões for acompanhada de medidas compensatórias de desoneração das exportações e oneração das importações, o impacto sobre a competitividade será positivo para todos os setores”, afirma o sumário executivo.
“Não estamos defendendo que se faça isso”, apressa-se em esclarecer Appy. “Nosso objetivo é trazer os números para a discussão. Não sei nem se um imposto é o melhor [meio de precificar o carbono] para o Brasil.”
Fonte: Folha
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