Com três das cinco maiores economias do bloco com poucas perspectivas de crescimento a curto prazo, o Mercosul se reúne em Caracas para discutir uma pauta fora do âmbito regional. A presidente do Brasil, Dilma Rousseff; da Argentina, Cristina Kirchner; do Uruguaio, José Mujica; do Paraguai, Horacio Cartes; além do anfitrião venezuelano, Nicolás Maduro, devem debater uma proposta de aproximação com a Aliança do Pacífico a ser apresentada pela presidente do Chile, Michelle Bachelet. Dificuldades econômicas e políticas diminuíram o dinamismo de Brasil, Argentina e Venezuela. Por iniciativa do presidente da Venezuela, o bloco deve anunciar também uma “zona de desenvolvimento econômico” entre o Mercosul e países caribenhos. Os presidentes ainda deverão se pronunciar em bloco sobre a crise da dívida externa da Argentina, país que pode entrar em “default” na quinta-feira por imposição da justiça dos Estados Unidos. Cristina Kirchner busca apoio internacional para atenuar o desgaste político que terá com a provável suspensão de pagamentos. A expectativa na Argentina é que a recessão local poderá chegar a 3% ao ano. Os presidentes irão se posicionar ainda sobre a ofensiva militar de Israel na faixa de Gaza, que fez com que o Brasil chamasse seu embaixador no país para consultas. Não se espera avanços em relação às negociações para um acordo de livre comércio entre o Mercosul e a União Europeia. Na avaliação do governo brasileiro, o bloco europeu está com dificuldades de fechar uma oferta para os países sul-americanos, o que deve fazer com que o assunto desça para um segundo plano. Os chanceleres dos países do bloco se reúnem hoje, para preparar a rápida reunião de cúpula entre os presidentes, que durará apenas a manhã de terça-feira. Além da presença dos presidentes dos cinco países membros e de Bachelet, também participam do encontro os presidentes da Bolívia, Evo Morales; de El Salvador, Salvador Sanchez Cerén; e da Nicarágua, Daniel Ortega. Bachelet deverá tratar de uma reunião de âmbito ministerial entre os países da Aliança do Pacífico e do Mercosul, em uma iniciativa sem ambições econômicas imediatas: a chilena trabalha para que as duas alianças deixem de representar um contraponto entre os países com maior abertura comercial, que integram a aliança; e os de menor abertura, dentro do bloco integrado pelo Brasil. Para o curto prazo, o Brasil tem uma proposta mais imediata, de antecipar de 2019 para este ano a eliminação de tarifas entre o Mercosul e Chile, Colômbia e Peru. A Colômbia poderá ser o principal foco de resistência a esta proposta de livre comércio entre os países do Mercosul e parte da Aliança do Pacífico. Segundo um integrante do governo brasileiro, a Colômbia é o único país da Aliança com menos de 90% dos produtos liberados de tarifa no comércio. Com o Chile e o Peru, já existe na prática um livre comércio com o Mercosul. Em paralelo, o Mercosul já está negociando as adesões do Equador como membro associado e do Suriname e Guiana como membros plenos. O ingresso da Bolívia como o sexto integrante do Mercosul está pendente de aprovação apenas dos congressos do Brasil e do Paraguai. A Venezuela está na iminência de alterar seu regime cambial para enfrentar uma crise fiscal, após quatro meses de distúrbios de rua estimulados pela oposição ao presidente Nicolás Maduro, que só arrefeceram após mediação da Unasul. O país só ingressou no bloco em 2012 e sua adaptação ao regime comercial do Mercosul se conclui apenas em 2017. Sem muito espaço para iniciativas ambiciosas, Maduro quer marcar a primeira presidência pro-tempore da Venezuela com a criação de uma cooperação entre o Mercosul e os países da América Central e Caribe. Nos últimos anos, a Venezuela forneceu a países como Nicarágua e Haiti cerca de 100 mil barris de petróleo por dia a preços subsidiados, por meio da Petrocaribe, uma associação entre a estatal venezuelana PDVSA e os países da região, além de aportar financiamento direto ao tesouro do governo haitiano para financiamento de gastos correntes. Há o temor, inclusive no governo brasileiro, de que uma redução da ajuda venezuelana poderia desestabilizar politicamente os países mais frágeis desta aliança. O Brasil já atua na região por meio de financiamentos do BNDES para projetos de infraestrutura tocados por empresas brasileiras e que envolvam a importação de equipamentos e insumos do país. A ajuda poderia ser ampliada agora. A cúpula de Caracas marcará ainda a reestreia do Paraguai como participante dos encontros presidenciais. Há pouco mais de dois anos, logo após o “impeachment” do então presidente Fernando Lugo, o Paraguai foi suspenso do Mercosul, durante a cúpula de Mendoza, na Argentina. Na mesma ocasião, a Venezuela foi entronizada como integrante efetiva do Mercosul, apesar da adesão não ter sido chancelada à época pelo congresso paraguaio. O impasse só foi solucionado após a eleição de um novo Congresso no Paraguai e a posse do presidente Horacio Cartes. O Paraguai está revendo todos os atos do Mercosul celebrados durante a suspensão.
Fonte: Valor Econômico