antonio delfim netto
No início de um novo mandato presidencial é preciso insistir: a sociedade espera do governo uma política social e econômica que atinja, simultaneamente, três objetivos não inteiramente compatíveis. Na linguagem do modesto keynesianismo dos anos 50 do século passado:
1. um nível de emprego tão alto quanto possível, com
2. uma taxa de inflação tão baixa e tão estável quanto possível e que
3. assegure a todos os cidadãos do país um nível de vida decente.
No quadriênio que se encerra, a primeira condição foi razoavelmente atendida com uma enorme inclusão no processo produtivo de mão de obra pouco qualificada e, portanto, com baixa produtividade, o que gerou um aparente paradoxo: o aumento do emprego com estagnação do PIB (Produto Interno Bruto).
Com relação à segunda, andamos todo o tempo a namorar com o limite superior de tolerância da meta de inflação (6,5%), fingindo que a estávamos cumprindo.
De qualquer forma, nunca se perdeu o controle do processo e, mais importante, recentemente diminuiu a distância entre o crescimento dos preços livres e os preços administrados.
Com relação à terceira condição, avançamos com os programas de aumento da igualdade de oportunidades (na educação e na saúde), na redução da pobreza e na redução do nível de desigualdade.
É preciso reconhecer, entretanto, que o resultado final de 2011-2014 revela perturbadores desequilíbrios:
1) exagerado deficit fiscal (quase 5% do PIB) e um aumento da relação dívida bruta/PIB a partir de um nível já relativamente elevado para um país como o Brasil e
2) a acumulação de deficits em conta corrente de 270 bilhões de dólares, o que é grave diante do baixo crescimento do PIB no período (em torno de 7%).
Eles são resultado da falta de maior coordenação entre a desejada e necessária política social (redistributiva) e a condição indispensável para a sua sustentação: uma política econômica (fiscal, monetária, salarial e cambial) estimuladora do aumento da produção e da produtividade.
A situação é incômoda e desagradável, mas não estaremos à beira de uma crise, a menos que não prestemos atenção aos novos tempos. É hora de o governo apresentar um programa coerente, transparente e crível que especifique o que vai fazer nos próximos dois anos para corrigir com inteligência e perseverança aqueles desequilíbrios.
Devolver a confiança e a previsibilidade ao setor privado é a única forma de cooptar trabalhadores e empresários para a volta do crescimento, sem o qual nada acontecerá.
Fonte: Folha