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Por Antonio Albani
A inflação medida pelo Índice de Preços ao Consumidor Semanal (IPCS) ficou em 0,88%, no final de dezembro, e acumulou, no ano de 2015, alta de 10,53%. Divulgados no dia 4 de janeiro pela Fundação Getulio Vargas (FGV), os números confirmam a maior alta generalizada de preços nos últimos 13 anos. Trata-se de um enorme problema em especial para quem possui contratos de execução continuada em vigor. Isso por ser muito provável, considerando a estabilidade econômica dos últimos anos, que esses contratos não possuam cláusulas bem estruturadas para a conjuntura atual.
Assim, uma das partes estará sujeita a grandes prejuízos. E o dano ainda pode ser maior, se levadas em conta as variações do câmbio, uma vez que a Lei nº 10.192/01 estabelece que os pagamentos de obrigações no território nacional deverão ser feitos obrigatoriamente em real, ainda que se tenha custos em dólar. O que é possível fazer nesses casos? O primeiro Código Civil brasileiro, de 1916, foi editado em um contexto de relativa estabilidade política e econômica.
Fruto da visão liberal da época, seus regramentos eram voltados à mais absoluta liberdade contratual, no chamado “pacta sunt servanda”. Dessa forma, o diploma fixou a taxa de juros em 6% ao ano (art. 1062) e, no tocante ao direito contratual, não disciplinou o instituto da lesão contratual, nem previu a possibilidade de aplicação da teoria da imprevisão. Com o tempo, após o surgimento de situações de nítidos desequilíbrios contratuais, todavia, doutrina e jurisprudência passaram a sustentar a aplicação da teoria da imprevisão, com base no art. 85 do revogado Código (“nas declarações de vontade se atenderá mais à sua intenção que ao sentido literal da linguagem”).
A lei admite, como critério de reajuste, a correção monetária por índices de preços gerais, setoriais ou que reflitam a variação dos custos A situação começou a mudar após o crash da Bolsa de Nova York, em 1929. Diante da grave crise que se instalou no setor cafeeiro, surgiram leis determinando o curso forçado da moeda. Em 1969, foi editado o Decreto Lei nº 85 (em vigor ainda hoje), cujo art. 1º estabelece que “são nulos de pleno direito os contratos, títulos e quaisquer documentos, bem como as obrigações que exequíveis no Brasil, estipulem pagamento em ouro, em moeda estrangeira, ou, por alguma forma, restrinjam ou recusem, nos seus efeitos, o curso legal do cruzeiro”.
Dez anos antes, a inflação já se tornara um problema grave, com o custo de vida em São Paulo aumentando 42,7% e, na Guanabara, 52%. Em 1963, durante o governo de João Goulart, a inflação atingira 80%; e, nos três primeiros meses de 1964, o índice acumulado chegara a 25%, em uma taxa anualizada de 144%.
Tal instabilidade financeira fomentou uma tendência revisionista de contratos, sobretudo nas relações privadas, com o estabelecimento dos seguintes critérios de reajuste de preços:
(i) restabelecimento do equilíbrio econômico financeiro do contrato, com aplicação da teoria da imprevisão e
(ii) cláusulas de prevenção à ruptura do equilíbrio econômico financeiro. O reequilíbrio econômico financeiro consiste em um procedimento destinado a restabelecer as bases contratuais, sempre que ocorrer algum evento que venha a afetar o equilíbrio original. Para que seja possível a recomposição da proporcionalidade, é essencial a demonstração de que o fato desencadeador do desequilíbrio era imprevisto ou imprevisível. A teoria da imprevisão encontra-se positivada no Código Civil, nos arts 478 a 480, que preveem a possibilidade de resolução judicial dos contratos.
Ressalta-se que, apesar de a norma se referir expressamente à resolução, a hermenêutica tem entendido pela possibilidade de recomposição do equilíbrio contratual (por aditamento contratual ou mesmo por intermédio de ação judicial), preservando-se a continuidade do pacto. Já as cláusulas de prevenção de desequilíbrio funcionam de forma automática, sendo, portanto, aplicáveis independentemente da constatação do efetivo desequilíbrio. Trata-se de uma situação em que as partes presumem a provável ocorrência de desequilíbrio e pactuam previamente a forma de recomposição. Um tipo de cláusula preventiva muito comum nos contratos celebrados no Brasil é a de reajuste, que visa a antecipação dos efeitos inflacionários.
A lei admite, como critério de reajuste, a estipulação de correção monetária por índices de preços gerais, setoriais ou que reflitam a variação dos custos de produção ou dos insumos utilizados nos contratos. A Lei nº 9.069, de 29 de junho de 1995, que dispõe sobre o Plano Real e o Sistema Monetário Nacional, bem como a Lei nº 10.192, de 14 de fevereiro de 2001, que trata de medidas complementares ao Plano Real, no entanto, estabelecem certas limitações impostas aos reajustes contratuais.
O art. 28 da Lei nº 9.069/95 e o art. 2º da Lei nº 10.192/01 prescrevem que será admitida a estipulação de correção monetária e de reajuste, desde que a periodicidade para aplicação de tais cláusulas seja igual ou superior a um ano. Uma alternativa é o fatiamento da execução do objeto contratual em vários contratos de curto ou médio prazo. Por outro lado, para contratos de longa duração que já se encontram em fase de execução, resta a discussão judicial, caso não se chegue a acordo para a renegociação do contrato entre as partes.
Antonio Albani é advogado de LL Advogados Este artigo reflete as opiniões do autor, e não do jornal Valor Econômico. O jornal não se responsabiliza e nem pode ser responsabilizado pelas informações acima ou por prejuízos de qualquer natureza em decorrência do uso dessas informações
Fonte: Valor
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