Pacote à indústria readapta medidas antigas



Produção em queda no começo deste ano, sem sinal de retomada forte, faz governo federal anunciar mudanças e atualizações em programas de estímulos

Presidente Dilma disse que governo atendeu a pedidos, e CNI pede mais rapidez em medidas futuras.

Sem conter novos recursos para a indústria acelerar a produção, algumas medidas foram anunciadas nesta quarta-feira pelo governo federal na tentativa de o setor produtivo voltar a crescer e ainda fazer uma aproximação com o empresariado. Apesar de começar valer agora, devem apresentar resultado a partir de 2015. A presidente Dilma Rousseff afirmou que as demandas atendidas pelo Palácio do Planalto foram apresentadas pelo setor há cerca de um mês, quando o Ministério da Fazenda discutia a manutenção do corte de impostos da folha de pagamentos. Perguntada se o pacote de bondades melhorava a relação do governo com os empresários, a presidente respondeu:

– Eu acho que não é só uma questão de melhorar a relação com os empresários. É uma questão de melhorar a questão da competitividade da nossa indústria.

Também foi pela melhoria da competitividade que o presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Robson de Andrade, avaliou as medidas anunciadas nesta quarta:

– O pacote pode fazer com que investimentos do setor no Brasil voltem com confiança.

Entre os pontos que estavam na pauta do empresariado e foram atendidos, Dilma destacou a retomada do Regime Especial de Reintegração de Valores Tributários para as Empresas Exportadoras (Reintegra), um incentivo a exportadores que perdeu validade no fim de 2013 – após a própria presidente ter vetado a prorrogação até o fim deste ano, como aprovado pelo Congresso.

O programa, que garantia aos exportadores crédito de PIS/Cofins de 3% decorrente das vendas para o Exterior, será recriado por meio de medida provisória, mas terá um crédito menor: variará entre 0,1% e 3%. Este ano, por exemplo, será de 0,3%.

Outro remodelado será o Refis da Crise, programa de renegociação de dívidas de contribuintes com a União. Conforme o ministro da Fazenda, Guido Mantega, a parcela de entrada do programa será reduzida para permitir que mais empresas possam solicitar o parcelamento.

Produto local terá vantagem em licitação

O valor da entrada será menor que o fixado pelo Congresso. Para dívidas de até R$ 1 milhão, deveria ser de 10%. Agora, será de 5%. Para dívidas maiores, haverá escalonamento de 10%, 15% ou 20%. Apenas para valores acima de R$ 20 milhões a prestação de entrada foi mantida em 20%. A adesão ao Refis da Crise vai até o fim de agosto.

O governo também definiu que manterá o Programa de Sustentação de Investimento (PSI), que concede financiamentos a juros baixos ao empresariado por meio do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). As taxas de juro dos empréstimos não foram anunciadas.

A equipe econômica ainda estabeleceu uma política de conteúdo local, definindo a margem única de vantagem de 25% para todos produtos nacionais. Isso significa que, em toda concorrência do governo para compras de produtos, os brasileiros, mesmo 25% mais caros do que concorrentes, terão prioridade. Antes, essa margem de vantagem variava conforme o produto.

O presidente da CNI avalia ainda que a lei de biodiversidade, que a presidente Dilma enviará ao Congresso, e o programa Brasil sem Burocracia também terão repercussão positiva.

O governo reforçou que serão mantidas em zero de forma permanente as alíquotas de Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) para materiais de construção e bens de capital (máquinas, equipamentos, caminhões e ônibus usados na produção).

Governo federal reuniu medidas antigas e deu uma sobrevida para alguns benefícios

PSI, a prorrogação
Previsto para terminar no fim de 2014, o Programa de Sustentação do Investimento (PSI), implementado pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) para liberar crédito mais barato para investimentos, foi prorrogado até 2015.

Reintegra, a volta
O Palácio do Planalto vai recriar e tornar permanente o Reintegra, que devolve parte dos impostos pagos por exportadores de manufaturados. A alíquota de devolução vai variar de 0,1% a 3%. Para este ano, segundo Mantega, a tarifa será de 0,3%. A cada ano o governo definirá a alíquota. Nas condições vigentes até 2013, o programa devolvia às empresas exportadoras 3% do faturamento com a exportação de produtos industrializados.

Refis da crise, a mudança
O programa de parcelamento de débitos de empresas com a União, Refis da crise, será modificado. Empresas com dívidas de até R$ 1 milhão precisarão dar de entrada 5% do valor para conseguir o parcelamento, não 10% como na regra atual. Para débitos de R$ 1 milhão a R$ 10 milhões, a quantia mínima passa a ser 10%. Depois, 15% para dívidas de R$ 10 milhões a R$ 20 milhões e de 20% para débitos acima de R$ 20 milhões.

Efeito prático deve chegar mais adiante

As medidas anunciadas para dar mais fôlego à indústria foram elogiadas por analistas e empresários do setor, mas têm efeitos limitados e não devem impulsionar o crescimento econômico este ano. O presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Robson de Andrade, destacou que as ações não são tímidas, mas cobrou que próximas decisões do governo para a iniciativa privada sejam tomadas com mais rapidez e listou setores que esperam ações do governo para se recuperar: máquinas e equipamentos, têxtil, químico, álcool e açúcar.

– Esses setores vão precisar de medidas específicas – observou, ressaltando que a CNI apresentou essas ações a Dilma.

Andrade também elogiou a renovação do Programa de Sustentação do Investimento (PSI) até o fim de 2015 e os percentuais de conteúdo local em licitações do governo, mas adiantou que é preciso trabalhar para que o juro do PSI de 2015 “seja mais baixo do que este ano”.

Julio Cesar Gomes de Almeida, ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda e professor da Unicamp, afirma que o anúncio das medidas indica que a presidente está disposta a conversar com a indústria, mas que o pacote em si só é bom “conceitualmente.”

– Para que o programa Reintegra seja eficaz de fato, a alíquota aplicada teria de ser de, pelo menos, 1,5% em vez do 0,3% anunciado. O resultado no futuro vai depender do fôlego fiscal do governo para ampliar esse percentual – afirma.

O ceticismo é compartilhado pela economista-chefe da ARX Investimentos, Solange Srour. Para Solange, o pacote não é capaz de retomar a confiança do empresariado como um todo, e o governo continua incentivando setores específicos no lugar de tratar de forma correta a questão da produtividade.

– As medidas anunciadas já foram utilizadas no passado e não resolveram o problema da competitividade, não trouxeram crescimento da indústria – lembrou a economista-chefe da ARX.

Economista define pacote como tímido

Na avaliação de Gomes de Almeida, da Unicamp, o Palácio do Planalto perdeu a oportunidade de lançar um programa específico para renovação de equipamentos industriais no país.

– Os parques no Brasil são velhos, a idade média é 16 anos. No Exterior, a média não chega a 10. É uma proposta que o Planalto já conhece, mas que resolveu não implementar. Ficou devendo – disse.

Para o economista Rafael Bistafa, da Rosenberg Associados, as medidas dificilmente alteram o quadro de deterioração da indústria nacional:

– O pacote é bastante tímido. Reedita velhas medidas com eficácia duvidosa em elevar a competitividade da indústria.

O economista cita, entre medidas que poderiam ser adotadas para melhorar a competitividade da indústria brasileira, alterações trabalhistas e tributárias estruturantes ou anúncios de investimentos em novas concessões de infraestrutura.

– Também não vimos nada para combater o custo Brasil – disse Bistafa.

Outros afagos

O governo sempre lança mão de pacotes para estimular a indústria assim que as máquinas perdem velocidade. Quando a economia começou a patinar, em 2012, o Ministério da Fazenda tratou de reeditar medidas que funcionaram bem para livrar o país da crise financeira mundial em 2008. A eficácia, no entanto, não foi a mesma, e o Produto Interno Bruto (PIB) não decolou.

Redução de impostos da folha de pagamento

Para estimular contratações, o Planalto abriu mão de arrecadação e cortou encargos trabalhistas em setores que empregam muito ou são estratégicos para o desenvolvimento da economia.

Funcionou? Pouco. Segmentos que utilizam bastante mão de obra, como vestuário e calçados, lideraram as dispensas na indústria em 2013. Em maio, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, anunciou que a medida que beneficia 56 setores será permanente, mas não atendeu ao pedido de empresários de incluir novas áreas ainda este ano.

Redução do IPI

O Planalto baixou o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) na compra de automóveis, móveis e eletrodomésticos. O objetivo era incentivar o consumo e estimular a produção da indústria.

Funcionou? Em parte. O consumo até cresceu, mas abaixo do esperado. O Produto Interno Bruto (PIB) não decolou, e as restrições impostas pela Argentina, principal parceiro do Brasil no Mercosul, diminuíram as exportações brasileiras de veículos, prejudicando o desempenho da indústria.

Capital de giro mais barato

Em 2012, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) anunciou corte de juros para capital de giro em empréstimos à indústria da transformação. Os cortes foram de 10% para 8% em financiamentos para grandes empresas e de 9,5% para 6% no crédito para micro e pequenas companhias.

Funcionou? Sim. Os empresários pedem agora mais dinheiro para o programa do BNDES. A solicitação não foi adiante porque vai na contramão do esforço do Banco Central (BC) para elevar o juro.

Fonte: Clicrbs

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