[:pt]PIB per capita poderá ficar ‘congelado’ por uma década[:]

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Por Flavia Lima

Armando Castelar, do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre­FGV): “É uma década perdida em termos de padrão de vida”

O padrão de vida do brasileiro corre risco de congelar ao longo desta década. Após recuar 0,7% em 2014, o Produto Interno Bruto (PIB) per capita deve cair 3,5% em 2015, com nova queda esperada para 2016. Diante da forte desvalorização do real, já era esperado um recuo do produto per capita em dólares. Com a piora expressiva das expectativas para a atividade econômica neste ano e no próximo, porém, a população ficará mais pobre em reais mesmo e ainda terá que lidar com uma renda per capita estagnada até o fim da década.

Em 2020, o PIB per capita brasileiro estará nos níveis registrados em 2010, prevê Armando Castelar, pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre­FGV). Segundo ele, tendo como base uma expectativa de queda de 3% para o PIB em 2015, de 2,1% em 2016 e esperando que o PIB volte a subir ao redor de 1% entre 2017 e 2020, é possível que o per capita encerre a década no zero a zero. “É uma década perdida em termos de padrão de vida”, lamenta. Jorge Arbache, professor de economia da Universidade de Brasília (UnB), espera uma baixa ainda maior para o PIB per capita em 2015, de 3,8%, seguida de recuos de 2,5% em 2016 e de 0,4% em 2017.

A volta para o terreno positivo ocorrerá apenas em 2018, em sua avaliação, período em que o per capita terá leve alta de 0,1%. Mesmo em reais, o caminho para que o PIB per capita volte a mirar um bom avanço não será tarefa simples. Nas contas de Antonio Corrêa de Lacerda, sócio­-diretor da ACLacerda Consultores e professor da PUC­SP, quando o per capita brasileiro crescia a uma taxa de 2,8% ao ano ­ algo que ocorreu de 2003 a 2010 ­, havia fôlego para dobrar esse indicador a cada 26 anos.

A uma taxa de 1,2% ao ano, como a registrada entre 2011 e 2014, o per capita dobraria em 59 anos. Com as novas projeções, o cenário se complica. “No fundo, é decepcionante”, diz. Lacerda lembra que, em dólares, considerando a depreciação cambial e queda estimada perto de 3% para o PIB em 2015, o produto per capita deve cair de US$ 11.566 registrado no ano passado para US$ 8.490 ­ um retorno para níveis próximos aos de 2009. Em um prazo mais longo, também em dólares, o recuo do PIB per capita é ainda mais evidente.

Segundo Lacerda, em 2018 estará próximo de US$ 7.900, ou 12% abaixo do registrado dez anos antes. Para ele, a medida tem mais um efeito estatístico e de comparação, uma vez que a renda do brasileiro não é integralmente gasta em dólares. Sinaliza, contudo, que o caminho para alcançar os países desenvolvidos ficou mais longo. Dados do Banco Mundial mostram que o Brasil se distancia mesmo de países que parecem enfrentar desafios econômicos ainda mais consideráveis.

Em 2014, o per capita brasileiro, de US$ 11.612, era praticamente metade do PIB per capita grego, de US$ 21.682. Mesmo em relação a Portugal (per capita de US$ 22.080), o intervalo era grande. Já o PIB per capita americano, de US$ 54.629, era quase cinco vezes maior que o brasileiro. O PIB per capita seria uma medida mais próxima dos ganhos de bem­ estar da sociedade, já que é usado no cálculo do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), junto com a escolaridade e a expectativa de vida.

Como o per capita considera a demografia, se o PIB sobe 4% e a população cresce 5%, na verdade os habitantes ficaram mais pobres, independentemente de o país ter crescido. É também por isso que o per capita brasileiro enfrenta momentos tão ruins: as projeções são de queda de PIB no curto prazo, enquanto a população deve continuar crescendo, em média, 0,8% pelo menos até 2020. Até 2012, diz Arbache, a aceleração do per capita em dólares deixou uma sensação de riqueza que trouxe consigo um estímulo ao consumo. “O salário mínimo em dólares subiu, as pessoas olhavam para os preços nos EUA e viam que estava tudo barato, alguns chegavam a passar um fim de semana na Disney”, brinca. “É claro que havia um problema e parte dele estava associado à valorização do real. Vivemos uma correção disso.”.

Para Lacerda, o quadro atual internacional é desfavorável e, internamente, vários dos instrumentos que foram utilizados para incentivar o mercado doméstico encontram­-se esgotados, como a expansão dos gastos públicos e do crédito ao consumidor. Arbache diz que a contração do PIB per capita é mais complicada em um momento que a economia mundial dá menos espaço para sair da crise. Um aspecto importante, diz ele, é que um per capita em queda acaba repelindo investidores externos ou multinacionais. “Não importa estar menos mal em relação à Venezuela, mas sim em relação à Índia e à Indonésia.

Em relação ao grupo que importa, estamos perdendo espaço”, diz. Segundo Lacerda, a saída para voltar à expansão econômica estaria no setor industrial. “Nesse sentido, o câmbio que joga contra o per capita em dólares e contra o PIB em valores correntes, é favorável ao crescimento no médio e longo prazo”, diz. Já Castelar afirma que os esforços devem se concentrar no investimento e na alta da produtividade. “O nível da atividade está restrito pela falta de confiança”, afirma. Para Arbache, o desafio em tempos de PIB em alta era como distribuir o crescimento.

A política de hoje é pensar o que fazer para mitigar os riscos da contração da economia, tentando preservar algumas políticas do passado, como o combate à miséria e desigualdade. Arbache avalia que o Brasil está próximo de um momento de ruptura, assim como o que antecedeu o fim do período de hiperinflação. “O regime fiscal está, talvez, jogando sementes para um novo período que vai ser a base para voltar a fazer crescer o PIB per capita”, diz. “Mas muito mais importante do que crescer, é crescer de forma sustentada, com políticas fiscal e monetária coerentes.”

Fonte: Valor[:]

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