Editada às vésperas do segundo turno das eleições presidenciais para agradar a setores da sociedade e do empresariado, a Medida Provisória (MP) 656 terá forte impacto negativo sobre o resultado primário das contas públicas, já em franca deterioração. A MP prorroga estímulos à economia e isenções tributárias, a um custo estimado em mais de R$ 30 bilhões, com pesado ônus para o governo federal, sendo R$ 9,2 bilhões em 2015.
A promessa de um superávit primário de 1,9% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2014 não será cumprida, ainda que o Ministério da Fazenda relute em admitir esse fato. Em 12 meses, até agosto, o superávit primário foi de 0,94% do PIB, metade da meta oficial. E, se do cálculo forem excluídas as receitas atípicas, o saldo positivo foi de apenas R$ 10 bilhões nos primeiros oito meses do ano, ou 10% da meta anual de R$ 99 bilhões. Como o crescimento do PIB deverá ser insatisfatório também em 2015, comprimindo as receitas, as benesses tornarão mais difícil a administração fiscal no primeiro ano do novo governo.
Como fez em outras ocasiões, o governo utilizou a MP 656 para contemplar diferentes áreas, pois seu texto trata de vários temas. Por exemplo, reduz a zero as alíquotas do PIS-Pasep e da Cofins para o PIS-Pasep-Importação e para a Cofins-Importação incidentes sobre a receita de vendas e na importação de partes utilizadas em aerogeradores. Isenta de IOF os repasses de recursos para obras de infraestrutura e mantém os incentivos sobre a venda a varejo de computadores, desktops e notebooks, tablets e smartphones. E ainda beneficia construtoras que trabalham com imóveis destinados ao programa de habitação social.
Nem todo o rol de decisões incluídas na MP 656 deve, de antemão, ser condenado, como é o caso da prorrogação da dedução do Imposto de Renda relativo ao pagamento do INSS de empregados domésticos pelos empregadores, pois a medida estimula o emprego.
O que surpreende é o descaso com que a meta fiscal é tratada. Trata-se de um indicador do grau de solvência do setor público. Nada tem de abstrato, ainda que pouco se fale dela no horário eleitoral. Quanto mais próximo se estiver do cumprimento da meta, menor será o risco de rebaixamento da classificação brasileira pelas agências de rating, que implicaria financiamentos mais caros, e mais estimulados se sentirão os investidores. É no que o governo deveria pensar antes de oferecer bondades de inspiração eleitoral.
Fonte: Estadão