Símbolos da pandemia patinam, mas estão melhores que em 2019

Símbolos da pandemia patinam, mas estão melhores que em 2019

Setores como os de álcool gel e máscaras apostam que hábitos adquiridos não serão descartados

 

O álcool gel já perdeu prestígio, a máscara deixou de ser obrigatória em boa parte do país, mas esses setores, assim como os de outros símbolos da pandemia, são hoje maiores que eram antes da chegada da covid-19 ao país, ainda que cheguem a enfrentar queda nas vendas e até saída de fabricantes do mercado.

A avaliação desses segmentos é que a situação não voltará a ser a mesma que a de 2019, uma vez que os hábitos adquiridos, como o uso de máscara ou o delivery de comida, não vão ser completamente descartados.

No mercado de máscaras tipo PFF2, a mais recomendada na prevenção contra a covid-19, o número de fabricantes nacionais certificadas passou de 23 para 68 nos últimos dois anos, o que fez a produção saltar de 10 milhões de máscaras por mês antes para 50 milhões no período, segundo a Associação Nacional da Indústria de Material de Segurança e Proteção ao Trabalho (Animaseg).

“Muita gente entrou no mercado porque viu uma oportunidade. Obviamente, agora vai sobrar produto e o número de fabricantes deve cair, mas acredito que não ao nível anterior ao da crise, por causa da maior conscientização em relação ao uso de equipamento de proteção individual”, diz Raul Casanova, diretor-executivo da entidade.

Nos cálculos da Animaseg, a categoria de protetores respiratórios, que inclui o PFF2, representava 5,5% das vendas da indústria de EPIs em 2019, número que saltou a 13% em 2020 e recuou para perto de 11% em 2021.

Um fator que pode ajudar a escoar a produção nacional é a exportação, diz Casanova. O mercado externo está fechado aos produtores brasileiros desde fevereiro de 2020, quando o governo declarou o Emergência em Saúde Pública de Importância Nacional. “Não tem mais motivo para impedir a exportação, ao passo que continuamos tendo imposto zerado para importação do produto até setembro”, reclama.

A DTS, de Santo André, foi uma das que decidiram aproveitar o salto na demanda, mas que agora vê uma forte oscilação na procura: foram 15 mil máscaras fabricadas em fevereiro, ante 160 mil no mesmo mês do ano passado.

“O cenário hoje está bem difícil. Temos contratos sendo cancelados por clientes que trabalham em hospital ou na parte administrativa. Eles têm optado por usar máscaras cirúrgicas, mais baratas”, diz Fabricio Perini, diretor comercial da empresa, que chegou a vender 50% de toda sua produção para clientes não industriais.

Enquanto o custo de produção de uma máscara PFF2 está em cerca de R$ 1, o da chamada máscara tripla está na casa de R$ 0,20.

No caso do álcool em gel para o varejo, a produção saltou de 52 toneladas por mês em 2019 para 700 toneladas em 2020, segundo dados da Associação Brasileira da Indústria de Higiene Pessoal, Perfumaria e Cosméticos (Abihpec). No ano passado, já havia recuado para 283 toneladas por mês.

João Carlos Basilio da Silva, presidente-executivo da entidade, reconhece inclusive que, por certa confusão na sociedade no início da pandemia, houve certo exagero no consumo do álcool em gel – apenas um substituto para o ato de lavar as mãos, diz.

“A categoria voltou a ter um patamar de representatividade baixo dentro da indústria, ainda que em um nível um pouco acima do que antes. Não é algo que empresas incorporaram em seu portfólio”, diz Silva.

Situação parecida ocorre entre os fabricantes de álcool para limpeza. “Toda empresa que possui registro como produtoras de saneante pode passar a produzir álcool para limpeza de superfície. Quando passarmos a viver uma endemia, muitos que entraram nesse mercado deverão sair. Mas isso não deve acarretar nenhuma demissão grande”, diz Paulo Engler, diretor-executivo da Associação Brasileira das Indústrias de Produtos de Higiene, Limpeza e Saneantes (Abipla). “Nossa indústria chegou a crescer 5,9% em 2020, mas em 2021 repetimos 2019 e devemos crescer 2% neste ano.”

Outro grande destaque da pandemia, o delivery de comida passou de 11% do tráfego do “food service” no último trimestre de 2019 para 31% nos primeiros três meses de 2020. Desde então, a sua participação tem oscilado dentro dessa faixa, reagindo de acordo com as idas e vindas das restrições à circulação – que afetam o atendimento presencial dos estabelecimentos.

No último trimestre do ano passado, a participação da modalidade caiu a 18%, a menor desde o início da pandemia. Apesar disso, ainda representou um volume de gasto 74% maior que o do mesmo período do ano anterior, segundo o Instituto Foodservice Brasil (IFB).

“O delivery ainda deve continuar crescendo em valores absolutos, mas em taxas menores que nesses últimos dois anos. Entretanto, com o retorno do tráfego nos salões, deve diminuir sua importância no share de vendas”, diz o presidente da entidade, Paulo Camargo.

No segmento de tecnologia da informação e comunicação (TIC), que já era destaque de crescimento mesmo antes da pandemia, as mudanças de comportamento trazidas pela quarentena e as restrições à circulação acabaram acelerando ainda mais o desempenho das empresas.

Não à toa, o faturamento do macrossetor – que comporta não só a parte de serviços e softwares, mas também estrutura física (hardware) e na nuvem – foi 36,4% maior em 2021 na comparação anual, com destaque para os serviços de software na nuvem e infraestrutura na nuvem, que cresceram 32% e 42%, respectivamente.

“A pandemia acelerou um processo que já acontecia. Mas, ao contrário do que acontece com as máscaras, que deixaram de ser obrigatórias, esses serviços se tornaram obrigatórios devido à transformação digital’, diz Sergio Paulo Galindo, presidente da Associação das Empresas de Tecnologia da Informação e Comunicação.

Para este os próximos anos, por outro lado, o segmento deve contar ainda com outro vento favorável, a implementação do padrão 5G no Brasil, diz o executivo. Com isso, a entidade projeta criação de 797 mil empregos nos próximos cinco anos. “É, atualmente, nosso maior gargalo, a mão de obra treinada”, diz Galindo.

Na subsidiária brasileira da japonesa NTT, o número de colaboradores dobrou na pandemia, saindo de 2,5 mil para pouco mais de 5 mil. “As empresas que já haviam conseguido digitalizar seus negócios antes da covid saíram na frente. Todo o restante teve que correr atrás”, diz Ricardo Neves, diretor-executivo. Entre os serviços que a NTT oferece, está o de aplicativos para a nuvem, inteligência artificial para entender o comportamento do consumidor e também segurança da informação.

No segmento de computadores e desktops, por outro lado, a sensação é de certa acomodação do mercado após dois bons anos de vendas, motivada sobretudo pela demanda adicional gerada pelo home office, mas também por empresas antecipando a atualização de suas máquinas, de olho nos problemas da cadeia global de suprimentos.

“Evidentemente, estamos esperando para 2022 uma retração em termos reais do segmento de informática, ainda que, em termos nominais, possa ter um resultado positivo, mas por causa do câmbio”, diz o presidente da Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (Abinee), Humberto Barbato. Para toda a indústria eletrônica, no entanto, a perspectiva é de crescimento real de 3%, motivado sobretudo pela atualização de aparelhos para a tecnologia 5G.

Fonte: Valor Econômico

 

 

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