[:pt]
Por Raymundo Costa
No momento em que se discute o impeachment da presidente da República, o PMDB apresentou ontem sua agenda para tirar o país da crise econômica. Também chamado de “Proposta Temer”, o documento faz duras críticas à condução da política econômica, demarca diferenças em relação ao PT e alinhava providências que prometem encaminhar em eventual governo do partido. Assinado pela Fundação Ulysses Guimarães, vinculada à sigla, o texto recebeu contribuições de diversos economistas brasileiros, entre os quais o exministro Delfim Neto.
A “Proposta Temer”, como é chamada dentro do partido, acaba com a indexação do salário mínimo, inclusive em relação aos benefícios previdenciários. Prevê também a reforma do orçamento, com o fim de todas as vinculações institucionais (casos dos gastos com saúde e educação), o orçamento impositivo e o chamado “orçamento com base zero” a cada ano os programas estatais são avaliados por um comitê independente que poderá sugerir sua continuação ou paralisação. Além da indexação do salário mínimo, outros pontos considerados inegociáveis pelo PT e pelo governo da presidente Dilma Rousseff também são questionados. Um deles é o regime de partilha na exploração de petróleo.
Outro, e a prevalência das convenções trabalhistas sobre a CLT nas negociações salariais. O anúncio do programa do PMDB, intitulado “Uma Ponte para o Futuro” ocorreu ontem no Palácio do Jaburu, residência oficial do vicepresidente Michel Temer. Ele recebeu jornalistas para um almoço, ao lado do presidente do Instituto Ulysses Guimarães, o exministro Moreira Franco, para divulgar e comentar o documento. Ambos repudiaram uma versão divulgada pelo jornal “Folha de S. Paulo” que acusa o PT de travar uma “luta fratricida sempre buscando diminuir o papel do PMDB”.
Segundo Moreira, tratase de um “documento apócrifo que nunca passou pela minha mesa”. Na realidade, o documento revela a divisão hoje existente no PMDB entre os que querem manter o apoio do partido ao governo, em troca de cargos e verbas orçamentárias, e aqueles que querem “desembarcar”, temendo a repercussão negativa que a aliança pode representar nas eleições de 2016. Há também quem defenda o impeachment da presidente e a posse do vice, Michel Temer.
O programa lançado ontem é praticamente uma manifestação de intenções do que esse grupo propõe fazer, se assumir o governo. Mais que o PT, o governo atual é o alvo do documento. Segundo o PMDB, suas propostas são “quase um consenso” no país. “A inércia e a imobilidade política têm impedido que elas se concretizem”, diz a proposta. “A presente crise fiscal e, principalmente econômica, com retração do PIB, alta inflação, juros muito elevados, desemprego crescente, paralisação dos investimentos produtivos e a completa ausência de horizontes estão obrigando a sociedade a encarar de frente o seu destino”, diz. Segundo o PMDB, ” nesta hora da verdade, em que o que está em jogo é nada menos que o futuro da Nação, impõem-se a formação de uma maioria política, mesmo que transitória e circunstancial, capaz, de num prazo curto, produzir todas estas decisões no Congresso Nacional”.
O partido se propõe a tentar esse entendimento, como fez por ocasião da votação das medidas do ajuste, quando Temer ainda respondia pela coordenação política do governo. No almoço de ontem o vice destacou o papel que tiveram o DEM, o PPS e o PV na votação das medidas. São todos partidos na oposição. O PMDB considera que a crise fiscal é “uma questão prévia”, sem cuja “solução ou encaminhamento, qualquer esforço para relançar a economia será inútil. nenhuma visão ideológica poderá mudar isso”.
As críticas mais duras são à questão fiscal. “Nosso desajuste fiscal chegou a um ponto crítico”, afirma o documento. “Sua solução será muito dura para o conjunto da população, terá que conter medidas de emergência, mas principalmente reformas estruturais”. Mais uma vez o PMDB insiste que essa será uma tarefa da política, dos partidos e do Congresso. “Não será nunca obra de especialistas financeiros, mas de políticos capazes de dar preferência às questões permanentes e de longo prazo”. “Nos últimos anos é possível dizer que o governo cometeu excessos, seja criando novos programas, seja ampliando os antigos ou mesmo admitindo novos servidores ou assumindo investimentos acima da capacidade fiscal do estado”, diz o documento. “A situação hoje poderia estar menos crítica”.
A “Proposta Temer” foi ontem mesmo enviada aos militantes do PMDB. O documento deve ser votado no congresso do partido marcado para o próximo dia 17. O vice-presidente ficou de enviar ainda ontem à tarde uma cópia da proposta à presidente Dilma Rousseff. O próprio governo, se quiser, disse Temer, pode usar a proposta pemedebista. O partido, é claro vai querer assumir a paternidade. Se o governo optar por outra proposta, o documento deve servir de base para uma candidatura própria do PMDB em 2018. Temer também falou com o ministro da Fazenda, Joaquim Levy. “Eu tenho certeza que o Levy concordará com isso”.
Temer conversou com Levy pelo telefone. O ministro estava em Londres e quis saber quais as propostas do PMDB. Temer falou da proposta na área trabalhista: “permitir que as convenções coletivas prevaleçam sobre as normas legais, salvo quanto aos direitos básicos”. Levy teria respondido “que coisa ótima, tenho discutido isso no governo e devemos levar isso adiante”, segundo Temer. O vicepresidente e o ministro da Fazenda mantêm relação próxima, aprofundada na época em que o vice assumiu a coordenação política.
O PMDB fala em programa para 2018, mas o próprio Temer ressaltou sua urgência. “Uma coisa é lançar um programa durante campanha eleitoral”, tratase da promessa de um candidato, “outra neste momento”, disse, o projeto adquire uma conotação partidária. “É para já e é para o futuro.” Na contramão do atual governo, o documento do PMDB também propõe a “inserção plena da economia brasileira, com maior abertura comercial e busca de acordos regionais de comércio em todas as áreas econômicas relevantes Estados Unidos, União Europeia e Ásia com ou sem a companhia do Mercosul, embora preferencialmente com ele”.
O documento reitera uma afirmação de Temer que deixou aborrecidos o PT e os principais auxiliares de Dilma: “O país clama por pacificação, pois o aprofundamento das divisões e a disseminação do ódio e dos ressentimentos estão inviabilizando os consensos políticos sem os quais nossas crises se tornaram maiores”. Temer disse que à época foi mal interpretado.
FONTE:VALOR
[:]