A reforma tributária e a saúde bucal dos brasileiros

A reforma tributária e a saúde bucal dos brasileiros

Regulamentação é oportunidade para corrigir equívocos e incorporar itens de higiene bucal na lista de produtos essenciais

O que é essencial para a saúde e a qualidade de vida da população?

Com a promulgação da reforma tributária no final de 2023, cresce o debate sobre quais segmentos são socialmente mais relevantes e poderiam, por meio de Lei Complementar, ficar isentos ou ter redução de carga tributária em categorias de produtos considerados essenciais, impactando de forma positiva o acesso dos brasileiros aos produtos de maior necessidade.

Uma das condições aprovadas na reforma tributária é a desoneração total da “cesta básica nacional de alimentos destinados ao consumo humano”, bem como a redução de 60% nas alíquotas dos impostos incidentes sobre o consumo de produtos e serviços essenciais, dentre eles, os produtos de limpeza e de higiene pessoal consumidos por famílias de baixa renda. No caso dos produtos de higiene pessoal, podem ser encontrados, dentre outros, os sabonetes, os dentifrícios e as escovas dentais.

Desde 2013, quando o governo federal decidiu incluir na cesta básica e zerar as alíquotas de PIS/Cofins para os produtos de higiene bucal como cremes dentais, fios dentais e enxaguatórios bucais, chama a atenção o fato de que o mesmo não aconteceu com as escovas dentais. Além disso, atualmente, dos 26 estados da federação e o DF, apenas 4 incluem itens de higiene bucal na cesta básica com alíquota reduzida, 2 incluem na cesta básica, mas não enquadram com alíquotas menores do que a modal e 1 estado, independente da composição de sua cesta básica, enquadra o creme dental em uma alíquota inferior à modal.

A complexidade de algumas definições tributárias como a classificação fiscal, determinada pela Nomenclatura Comum do Mercosul/Sistema Harmonizado (NCM/SH), enquadra a escova de dentes na mesma categoria de artigos como pincéis, espanadores e vassouras, cuja tributação é superior aos produtos de higiene bucal inseridos na cesta básica federal, o que encarece de forma significativa esse tipo de produto. Para exemplificar, enquanto a alíquota de PIS/Cofins de um creme dental é de 0%, na escova de dentes é de 12,5%. Nos estados, a alíquota média de ICMS dos cremes dentais é de 18%. Em São Paulo, a alíquota de ICMS é de 12%, enquanto Minas Gerais considera este produto supérfluo e o tributa pela alíquota de 25%.

Há anos, a alta tributação vem impactando a categoria de escovas de dentes, tanto que o Brasil deixou de ser competitivo na fabricação nacional. Atualmente, 80% das escovas de dentes utilizadas no país vêm de fora, produzidas na China e na Índia, e a estimativa é que o país gaste US$ 500 milhões (R$ 2,6 bilhões) com a importação de escovas de dentes nos próximos dez anos.

Dados mostram que boa parte dos brasileiros ainda têm pouco acesso à higiene bucal adequada e para possibilitar o acesso a pessoas de baixa renda, mexer na tributação do conjunto de produtos que promovem a manutenção da saúde bucal é indispensável. Em uma pesquisa realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2019, a proporção de adultos que usavam escova de dentes, pasta de dente e fio dental era 63,0%. Considerando os níveis de escolarização, apenas 38,5% das pessoas sem instrução ou com fundamental incompleto tinham esse hábito, enquanto esse percentual foi de 88,6% entre as pessoas com nível superior completo.[1]

O IBGE também apontou que 34 milhões de brasileiros com mais de 18 anos perderam 13 dentes ou mais, e 14 milhões de pessoas perderam todos os dentes. O mesmo estudo apontou que menos da metade dos brasileiros consultou um dentista nos 12 meses anteriores ao levantamento.[2]

A Emenda Constitucional da reforma tributária promulgada em dezembro de 2023, abriu a possibilidade de alíquotas reduzidas em 60% ou de não se cobrar impostos sobre produtos como certos medicamentos, dispositivos de acessibilidade e saúde menstrual. A lista fechada dos produtos com tributação mais baixa dependerá de lei complementar, que regulamentará o tema ainda este ano.

Fica claro que a saúde bucal não pode ficar de fora, pois ela impacta na saúde integral e na qualidade de vida das pessoas, com reflexos na sociedade como um todo. A redução da carga tributária de cremes dentais, fios dentais, escovas de dentes e enxaguatórios bucais possibilitaria a milhões de brasileiros, o acesso à manutenção da saúde bucal, com implicações positivas diretas em aspectos sociais e na saúde pública.

A nova regulamentação de produtos que terão redução de carga tributária representa uma oportunidade única para corrigir equívocos e incorporar os produtos de higiene bucal – assim como outros itens de higiene pessoal – na lista de produtos essenciais para a saúde da população, tornando-os mais acessíveis por meio de uma tributação mais adequada e menos onerosa. A hora é agora!


[1] Pesquisa Nacional de Saúde 2019. IBGE. Disponível em https://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/livros/liv101764.pdf

[2] Biblioteca Virtual em Saúde. Ministério da Saúde. Disponível em https://bvsms.saude.gov.br/tenha-orgulho-de-sua-boca-20-3-dia-mundial-da-saude-bucal-2/

Fonte: https://www.jota.info/opiniao-e-analise/artigos/a-reforma-tributaria-e-a-saude-bucal-dos-brasileiros-20032024

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