Em março, quando Wen Jiabao anunciou a meta de 7,5% de crescimento da China para este ano, a maioria dos analistas avaliava que o premiê estava sendo cauteloso demais e que a economia do país, a segunda maior do mundo, teria uma expansão bem mais forte. A economia da China superou sistematicamente as metas anuais nos últimos dez anos. Alcançou, em média, nesse período, um crescimento pouco inferior a 11%, apesar da crise financeira mundial de 2008-09. Mas, com o desaquecimento muito maior que o previsto do nível de atividade econômica dos últimos meses, a meta de 7,5% já começa a parecer ambiciosa.A expansão da economia chinesa desacelerou para 7,6% no segundo trimestre, contra 8,1% do primeiro. A esse ritmo o país parece tender a computar sua menor taxa de crescimento anual desde 1999.Mesmo após Pequim reduzir as taxas de juros pela primeira vez em quase quatro anos, no início de junho, e de ter voltado a cortá-la um mês depois, a maioria dos indicadores econômicos teve desaceleração, que avançou julho adentro.A produção industrial cresceu 9,2% em julho, em comparação com o mesmo mês de 2011. A expansão foi menor que os 9,5% de junho. As exportações chinesas, por seu lado, aumentaram só 1% se comparadas ao mesmo período do ano passado, após avanço de 11,3% em junho. Os dados dos novos empréstimos bancários de julho também decepcionaram.Alguns analistas começam a examinar as consequências para o país e o restante do mundo de um possível “pouso forçado”, num momento em que a UE está atolada na crise e a potência econômica representada pelos EUA vem negando fogo.”Um pouso forçado da China seria semelhante ao quarto trimestre de 2008 e ao primeiro trimestre de 2009, quando as exportações desabaram, as fábricas deixaram de receber encomendas e trabalhadores migrantes foram demitidos aos milhões”, diz Wang Tao, economista do UBS. “Isso ainda não aconteceu e provavelmente não vai acontecer, a não ser que a UE se desintegre e ocorra um grave problema no mercado imobiliário [chinês].”Os investimentos em imóveis responderam por mais de 13% do PIB da China no primeiro semestre do ano. O setor foi um motor do crescimento durante a maior parte dos últimos dez anos. Mas selvas de prédios residenciais desocupados cobrem boa parte do país, e a venda de terrenos para incorporação caiu 24,3% nos sete primeiros meses do ano, em relação ao mesmo período do ano passado. Isso sugere que os investimentos no setor não devem se sustentar no futuro.Em junho, o preço dos imóveis residenciais de muitas cidades de grande porte subiu pela primeira vez em quase um ano, e voltou a aumentar, embora ligeiramente, em julho. Mas isso não é necessariamente um bom prognóstico, pois o governo passou os últimos dois anos tentando conter a disparada dos preços, cuja alta fechou o acesso à casa própria para a maioria da população. Em vista disso, um forte repique dos preços poderá levar à adoção de restrições ainda maiores ao setor imobiliário.Um pouso forçado da China teria um efeito devastador sobre países exportadores de commodities, como Austrália, Brasil e Indonésia, que dependem da demanda chinesa, mas haverá, também, consequências não tão diretas.”Se a China fizer, efetivamente, um pouso forçado, a repercussão disso terá enormes ramificações sobre o grau de confiança do investidor mundial e tumultuará todos os mercados financeiros mundiais”, disse o economista Alistair Thornton, da IHS Global Insight. Embora a desaceleração da China tenha sido relativamente branda até agora, seu impacto sobre o lucro das empresas é desproporcionalmente grande, em especial no caso de incorporadoras e de empresas afins ao setor de construção. As vendas de maquinário de construção despencaram, dezenas de siderúrgicas estão reduzindo a produção e grandes empresas estatais de mineração e transportes divulgaram prejuízos no primeiro semestre do ano. A situação de deterioração já afetou a disposição do investidor mundial. Os investimentos estrangeiros diretos na China caíram 8,7% em julho, em relação ao mesmo mês de 2011, e recuaram 3,6% nos sete primeiros meses do ano. Alguns analistas consideram que a desaceleração é mais estrutural do que cíclica, e que o governo chinês, mesmo se quiser, não conseguirá fazer muito para estimular uma recuperação do crescimento. “Há indícios convincentes para crer que a economia chinesa está, na verdade, crescendo a apenas 4% ou 5% neste momento, com base numa combinação de outros indicadores”, diz Patrick Chovanec, membro da faculdade de administração de empresas da Universidade Tsinghua, de Pequim. “Do crescimento de 9,2% do PIB da China em 2011, 5 pontos percentuais vieram de investimentos. Isso significa que, se a China construir o mesmo número de estradas, pontes, prédios e mansões que no ano passado, e não mais do que isso, ela vai cortar 5 pontos percentuais do crescimento do PIB deste ano”, diz ele. “A expansão depende de níveis crescentes de investimento, num ambiente em que esse investimento não está dando retorno adequado.” Autoridades e artigos na mídia estatal sugerem que os governos locais conseguirão neutralizar os efeitos da queda das exportações e da construção residencial se desencadearem uma farra na área de infraestrutura. Mas analistas alertam para o fato de a receita dos governos municipais dependem do imposto de renda corporativo e da venda de terreno para incorporadoras. Esses dois fatores estão em queda, o que enfraquece a posição dessas administrações para abrir uma nova rodada de construções.Na quarta-feira, Wen encerrou uma viagem pela industrializada região do delta do rio Yang-tsé com um pronunciamento voltado a reforçar a confiança numa economia que está se enfraquecendo. “Quanto mais difícil a situação, maior a confiança que temos de ter”, disse ele, em frase destacada pela mídia estatal chinesa. “Temos as condições e a capacidade para cumprir definitivamente as metas econômicas e de desenvolvimento social deste ano”. Os investidores chineses não são os únicos a esperar que ele tenha razão. (Fonte: Valor Econômico)