O iminente “default técnico” da Argentina ocupou boa parte da reunião fechada de ontem entre os chanceleres do Mercosul, em Caracas. A Argentina poderá ter os pagamentos de sua dívida externa suspensos na quinta-feira, em função da decisão judicial nos Estados Unidos, que obriga a liquidação pelo valor de face de títulos em poder dos chamados “fundos abutres”. Na reunião de cúpula, marcada para hoje, o tema deve ser abordado pela presidente argentina Cristina Kirchner, que deve receber o respaldo do restante do bloco.
“O que nos preocupa é a segurança para a reestruturação das dívidas soberanas. Esse descalabro contra a Argentina conspira contra reestruturações futuras. Essa posição é unânime no Mercosul”, disse, no fim da reunião de chanceleres, o ministro paraguaio Eladio Loyzaga.
No governo brasileiro, se ressaltou que o Brasil fez uma apresentação como “amicus curiae” (parte interessada) a favor da Argentina, quando o país apelou para a Suprema Corte dos Estados Unidos contra a decisão da segunda instância, alegando o risco de uma crise sistêmica.
Na reunião de ontem não foram discutidos os efeitos práticos de uma crise da dívida argentina no bloco regional. “O ‘default’ ainda não aconteceu, portanto não há o que discutir sobre efeitos no fluxo intrarregional de divisas”, disse Loyzaga.
Na parte aberta da reunião, o chanceler argentino Hector Timerman disse que o país “agradece profundamente o incondicional respaldo que recebeu dos demais integrantes do bloco”. O tema, entretanto, não foi abordado por nenhum dos chanceleres que discursaram em seguida.
O ministro das Relações Exteriores do Brasil, Luiz Alberto Figueiredo, confirmou que o Mercosul procurará negociar até o fim do ano acordo para reduzir a zero as tarifas com os países da Aliança do Pacífico, com exceção do México.
“No caso do Chile, por exemplo, no fim deste ano já deveremos ter tarifa zero com relação à quase totalidade das linhas tarifárias que temos com eles”, disse Figueiredo. O maior problema para a integração é com a Colômbia, que só zerou a tarifa de 58% dos produtos de sua pauta.
Ontem, durante a reunião do Conselho do Mercosul em Caracas, Figueiredo cobrou maior dinamismo no comércio interno do bloco. De acordo com o ministro, o fluxo entre Brasil, Argentina, Venezuela, Uruguai e Paraguai “é o elemento de maior impacto da integração” e o intercâmbio precisa “renovar sua fluidez” e “resguardar os ganhos das últimas décadas”.
A mensagem de Figueiredo é uma referência indireta à Argentina. A corrente do comércio do Brasil com o país vizinho chegou a ser de US$ 40 bilhões em 2011, mas medidas protecionistas adotadas pelo governo argentino têm impactado as exportações brasileiras. Minutos antes do discurso de Figueiredo, a ministra da Produção da Argentina, Débora Giorgi, havia enfatizado em seu discurso uma outra vertente do bloco, a de servir de plataforma para a integração com outros países.
De acordo com Débora, “as exportações extrazona crescem mais que as intrazona, e crescem sem valor agregado”. A Argentina assume hoje presidência pro-tempore do Mercosul, sucedendo a Venezuela.
Fonte: Valor Econômico