Denúncia espontânea não libera de multa

 

Por Joice Bacelo

O Estado de São Paulo decidiu que o contribuinte que solicitar cancelamento de nota fiscal eletrônica (NF­e) ou conhecimento de transporte eletrônico (CT­e) depois do prazo previsto em lei poderá ser multado, mesmo em caso de denúncia espontânea. O instrumento, previsto no Código Tributário Nacional (CTN), assegura isenção de multa a quem confessar que deixou de cumprir determinada obrigação tributária, antes de uma autuação fiscal. A multa estipulada pela Fazenda paulista, porém, será menor se ocorrer a denúncia espontânea, correspondendo a 1%.

E subirá para 10% se a infração for descoberta pela fiscalização. A determinação está na Decisão Normativa CAT nº 2, publicada no Diário Oficial da última sexta­-feira. Os prazos para cancelamento de nota fiscal eletrônica e de conhecimento de transporte eletrônico são, respectivamente, de 24 horas e sete dias. Para o advogado Marcelo Bolognese, do escritório que leva seu nome, a norma da Fazenda paulista está em desacordo com o CTN. Ele cita o artigo 138, que trata sobre denúncia espontânea. “A iniciativa do contribuinte no oferecimento da denúncia espontânea tem a virtude de evitar a aplicação da multa de natureza punitiva.

Não se pode alterar tal conceito, muito menos por meio de uma decisão normativa”, diz. Apesar de concordar que o Fisco está reinterpretando um dispositivo do CTN, a tributarista Gabriela Jajah, do Siqueira Castro Advogados, acredita que o conceito de denúncia espontânea está um pouco ultrapassado. Ela destaca que, na época em que o código foi editado, as condições de fiscalização eram outras. “As informações hoje são todas alimentadas por sistema eletrônico, com cruzamento de dados.

O Fisco não precisa mais ir até um estabelecimento para autuar”, afirma a tributarista. “O conceito, de fato, vai mudando e se adaptando aos mecanismos que o Estado dispõe.” O advogado Douglas Mota, do Demarest Advogados, chama a atenção para o fato de já existir decisões no Superior Tribunal de Justiça (STJ) sobre a aplicação dos efeitos da denúncia espontânea nas situações sobre obrigações acessórias ­ desvinculadas do pagamento de tributos.

Um dos julgamentos da 2ª Turma, em maio deste ano, tratou sobre a entrega da Declaração de Contribuições e Tributos Federais (DCTF), e o relator do processo, ministro Humberto Martins, afirmou que “os feitos do artigo 138 do CTN não se estendem às obrigações acessórias”. “Faço essa ligação com o STJ porque, de acordo com os ministros, as obrigações acessórias não estariam dentro do que o Código Tributário Nacional prevê”, afirma Mota. “Mas é preciso analisar caso a caso.” Douglas Campanini, consultor da Athros, complementa que dentro da anulação dos efeitos da denúncia espontânea para as obrigações acessórias também se inclui, por exemplo, a declaração do Imposto de Renda.

“Se o contribuinte entregar depois do prazo, ele também terá que pagar multa”, compara. “Temos que dizer que o Fisco está seguindo o entendimento do STJ.” Diretor­ adjunto da Consultoria Tributária da Fazenda paulista, Ivan Ozawa Ozai, afirma que a decisão normativa foi publicada porque havia muitas dúvidas de contribuintes sobre a questão. Segundo ele, não há como se aplicar o instrumento da denúncia espontânea porque já existe previsão de multa para essa situação. “A legislação prevê multa para o contribuinte que cancelou com atraso. Ou seja, já se parte da premissa de que o ato de informar será voluntário”, diz o diretor­ adjunto. “Se aplicássemos a denúncia espontânea neste caso, estaríamos anulando completamente o efeito da própria pena.”

Fonte: Valor

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