Meta de inflação move embate entre Arminio e Mantega

Miriam Leitão com Mantega e Arminio: em vários momentos a apresentadora abriu espaço para que um contestasse dados e declarações feitos pelo outro

Em meio a acusações e versões sobre o impacto e a duração da crise econômica mundial e as políticas adotadas nos governos tucano (1995-2002) e petista (desde 2003), o ministro da Fazenda Guido Mantega – já dispensado do cargo pela presidente Dilma Rousseff em um próximo governo – e o ex-presidente do Banco Central, Arminio Fraga – apontado pelo candidato do PSDB, Aécio Neves, como o provável ministro caso vença a disputa no dia 26 – deram tom ideológico ao debate realizado pela Globonews, no programa Espaço Aberto.

Fraga disse que o atual modelo econômico não está dando resultados, chamou a política de controle de inflação de “descoordenada” e criticou os custos dos subsídios dados ao BNDES para redução das taxas de juros. Também acusou o ministro da Fazenda de colocar informações econômicas fora do contexto.

Mantega ressaltou as diferenças ideológicas entre as propostas do PT e do PSDB. Na opinião do ministro, o PSDB enfatiza o tripé macroeconômico – meta de inflação, superávit fiscal e câmbio flutuante -, o que não é suficiente. Para ele, é possível dar continuidade a um programa de desenvolvimento que prioriza a geração de emprego e a redução da pobreza, além de ampliar a renda per capita. “A renda per capita brasileira de 1995 a 2002 cresceu 3%. De 2003 a 2013, cresceu 30%. Nós temos condições de continuar elevando a renda per capita nessa trajetória: mais 30% nos próximos oito anos”, disse.

Em vários momentos, a apresentadora Miriam Leitão abriu espaço para que um contestasse dados e declarações feitos pelo outro. Ela própria rebateu informações do ministro, em um dos momentos em que ele atribuiu o baixo crescimento à crise internacional. “A crise começou em 2008 e teve seus momentos. Esse momento de 2014 não é de nenhuma dificuldade especial”, disse a apresentadora.

Fraga discordou das declarações do ministro sobre o que seria o enfoque do PSDB no tripé macroeconômico.

“Na crise, tivemos que fazer uma política anticíclica, reduzir tributos para dar competitividade para as empresas, dar subsídio para que as taxas de juros fossem mais baixas. Ele não faria”, disse Mantega, em referência a Fraga, que respondeu lembrando ter aprovado as medidas anticíclicas adotadas pelo governo petista no auge da crise, que “esquentou em 2008 e teve o pior momento em 2009”.

Segundo o tucano, a proposta do PSDB procura abordar as questões mais fundamentais, não só o ângulo macroeconômico. “(O Brasil) precisa de um modelo que gere juros mais baixos para todo mundo e não só para quem toma dinheiro no BNDES. Isso é básico”, afirmou, criticando o apoio do BNDES a grandes empresas “que podem acessar o mercado”, como frigoríficos e a Petrobras. “Do ponto de vista distributivo, esse modelo é absolutamente errado”, declarou, sobre a política de equalização dos juros do banco estatal.

O tema em que os dois mais fizeram comparação entre as gestões tucana e petista foi no combate à inflação. O ministro afirmou que há 11 anos o governo petista cumpre a meta inflacionária e tentou alfinetar a trajetória de Fraga no combate inflacionário. “Quando o Arminio era presidente do BC, ele pegou com 7% em 1999 e entregou com 12% em 2002”, citou. “Então, não é fácil controlar a inflação. Esse é um problema permanente e temos tudo sob controle”, assegurou.

Fraga rebateu a afirmação e lembrou das dificuldades que enfrentou, principalmente a pressão cambial. Em 1999, seu primeiro ano a frente do BC, o Brasil saiu do regime de câmbio controlado – as bandas cambiais, utilizadas como âncoras do Plano Real no final do primeiro governo tucano – para o câmbio flutuante. Com isso, o dólar subiu com impacto direto na inflação e a situação só se estabilizou com a adoção do regime de metas inflacionárias, quando ele assumiu o BC. Em 2002, Fraga lembrou que a pressão foi política. As especulações em torno da eleição presidencial levaram o dólar a passar de R$ 2 para R$ 4, também com pressão sobre a inflação.

“Naquele momento (1999) houve um pânico no Brasil. A expectativa de inflação quando cheguei estava em torno de 20% a 30%. Havia muito medo de que o Plano Real fosse deixar de existir. Nós respondemos, como todo mundo sabe hoje, e acabou que a inflação ficou em 9 % naquele ano, que foi um momento de muita tensão e bom resultado”, disse, lembrando que havia consenso de que haveria queda do Produto Interno Bruto (PIB) de 4% – mas o PIB acabou crescendo naquele ano (aumento de 0,3%, segundo dado revisado pelo IBGE em 2007).

Mantega rebateu as afirmações de Arminio de que a inflação em 2002 teria subido por conta de um “pânico político” originado pela perspectiva de uma gestão petista. “A economia brasileira não tinha como pagar seus vencimentos externos. Então, teve que recorrer ao Fundo Monetário [Internacional], não foi por causa da iminência de perder a eleição [o avanço da inflação]”, afirmou. “A economia brasileira estava fragilizada, teve que recorrer ao Fundo Monetário; o Fundo Monetário foi soltando [aportes] aos poucos e isso criou instabilidade”, avaliou. “Hoje em dia, nós temos reservas, temos dívida melhor, endividamento menor, então nós conseguimos manter a situação mais sob controle”, considerou.

A apresentadora aproveitou a afirmação para questionar o representante do PSDB sobre as acusações da presidente Dilma de que o governo do partido quebrou o Brasil três vezes. Ela tem afirmado isso em referência às três vezes em que o país recorreu ao FMI entre 1995 e 2002. Segundo Arminio, em 1999 houve ajuda de capital externo “mas não porque havia qualquer dificuldade de honrar compromissos”, em sua avaliação. “Foi para suavizar o ajuste aqui dentro. Havia uma situação em que o mercado se fecha e a nossa preocupação era não punir a população com uma recessão desnecessária. O FMI serve para isso. É um dinheiro barato que naquele momento nos ajudou bastante”, explicou.

Entretanto, após falar sobre o passado, Fraga comentou que seria mais interessante focar o debate no momento atual. “Essa é uma história interessante. Mas estou mais preocupado com o que está acontecendo hoje porque temos um crescimento extremamente baixo, uma inflação controlada de maneira artificial e já vimos esse filme. Essa é uma doença que é grave”, assinalou.

O candidato a ministro considera a situação bastante perigosa. Para ele, a herança do atual governo será “restos a pagar, pedaladas e contabilidade criativa”. “Dar transparência e encarar problemas de frente não é só uma questão econômica. É uma questão da democracia”, disse, garantindo que a proposta do PSDB é arrumar a casa. “Estamos dando subsídio para empresa que não precisa, fora do momento de crise. Esse é o ponto”, disse.

O atual ministro garantiu que o Brasil sairá da crise com a economia mais sólida do que entrou e poderá investir na melhoria da qualidade dos serviços públicas, uma das demandas dos eleitores. “Estamos fazendo as reformas. A reforma tributária já começou. Fizemos o simples. Estamos fazendo a reforma do ICMS no Congresso e temos pronta a reforma do PIS/Cofins”, declarou.


Fonte: Valor Econômico

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