Momento requer ainda mais estratégia e inovação

Retração em higiene e beleza e limpeza praticamente estável marcam um ano mais difícil, porém desafiador

A turbulência política e econômica no Brasil certamente alcança os setores de higiene e beleza e de limpeza no País. O desempenho em 2015 trouxe resultados negativos e positivos a esses mercados; algumas empresas aproveitaram o período mais difícil para obter crescimento em determinados segmentos. E para vencer os desafios que o momento trouxe e ainda traz, as melhores saídas continuam a ser a inovação e a percepção de oportunidades.

A Unilever é uma das fabricantes de produtos que considera o País estratégico para os seus negócios. Apesar do momento ruim que enfrenta, ele continua sendo um mercado importante e com muitas oportunidades de negócio, segundo Juliana Carvalho, diretora de marketing de amaciantes da empresa. “Estamos no Brasil há 86 anos. Passamos por diversos momentos econômicos no País e nunca deixamos de investir no mercado brasileiro. Nossa estratégia de negócios para o País é de longo prazo”, afirma.

Segundo a executiva, a empresa não para de fortalecer a sua relação com o público. “Continuaremos trabalhando para assegurar uma relação funcional e emocional com o consumidor. Os nossos investimentos são contínuos e, por isso, estamos sempre no topo do ranking”, completa Juliana.

Otimismo – A fornecedora de matérias-primas Oxiteno também acredita na retomada do mercado brasileiro e no potencial de crescimento para a região do Mercosul. No início desse ano, a empresa divulgou o aumento de sua capacidade produtiva da linha de sulfatados, em duas fábricas no País, em Tremembé e Suzano, e uma no Uruguai, em Montevidéu. No total, a ampliação é de 10%, segundo Mauricio de Andrade Lopes, diretor da empresa.

Os ingredientes envolvidos, segundo o executivo, são os principais tensoativos para o mercado de xampus, de limpeza do cabelo. Já o crescimento desses insumos no setor de limpeza, no qual também são usados, é puxado pelo avanço dos detergentes líquidos para roupas. O detergente de louças também fortalece os negócios nesse nicho. “(Esses) Não crescem tanto, mas estão presente em praticamente 100% das casas”, afirma o executivo.

A ampliação em questão, Lopes acrescenta, é fundamental para “a empresa conseguir entregar ainda mais e melhor”. “Esses mercados têm sentido a crise, mas logo devem voltar a crescer significativamente, e as pessoas vão passar a consumir produtos melhores”, conclui.

Exemplos de quem aproveita o momento de crise para obter bons resultados vêm do segmento de amaciantes, do qual também falamos nessa edição da revista. Um deles é a busca por preço. “A dona de casa já se acostumou a ter o amaciante para o processo de lavagem de roupas, portanto ela não deixará de comprar esse item por causa da crise; ao invés de deixar de comprar, ela vai conhecer novas marcas que sejam mais baratas, e passar a consumir a que tiver melhor qualidade com custo que ela precisa”, diz Talita Morillo, diretora de marketing da Gtex Brasil.

Quem também enxerga oportunidades é o diretor-presidente da Girando Sol. “A crise em alguns aspectos nos favorece, pois somos uma empresa que mantém um padrão de qualidade com preço justo”, afirma. Só em amaciantes, a empresa aumentou o faturamento em 8% no ano passado.

Grandes marcas das principais players do setor também acreditam que na crise os seus produtos se fortalecem. “A P&G atua em categorias-chaves e em momentos de maior crise econômica são produtos que seguem na cesta do consumidor”, diz Rodrigo Padilla, gerente da marca Downy. O consumidor, segundo ele, precisa fazer escolhas mais inteligentes, com equilíbrio de gastos e priorização.

“Ele provou produtos de qualidade superior e sabe do custo-benefício melhor”, diz. “O que vemos ocorrer são opções por embalagens mais econômicas, que passam a ser compradas em canais que antes não as ofereciam, ou por embalagens menores, quando o consumidor não tem um desembolso suficiente para a embalagem maior”, acrescenta Padilla. “Isso é o que chamamos de efeito ampulheta”, explica. No segmento de xampus, a procura por embalagens maiores também foi identificada pela empresa.

No setor cosmético, também há otimismo, pautado no trabalho e no esforço para enfrentar adversidades. “A crise é uma realidade que atingiu o mercado como um todo. Estamos concentrando nossos esforços em sermos ainda mais criativos, inovadores e assertivos para continuar crescendo”, diz Aline Mori, gerente da categoria de cuidados pessoais de O Boticário.

Retração – O setor brasileiro de higiene e beleza sofreu queda real de 8% em 2015 em relação ao ano anterior, com um faturamento “Ex-Factory”, líquido de imposto sobre vendas, de R$ 42,6 bilhões, segundo a Abihpec (Associação Brasileira da Indústria de Higiene Pessoal, Perfumaria e Cosméticos). Além disso, também perdeu representatividade em relação ao consumo mundial.

O Brasil caiu de terceiro colocado para quarto no ranking mundial de consumo. Agora, o País está atrás de Estados Unidos, China e Japão. Nas categorias, também houve perda. Desodorantes, proteção solar e perfumes perderam a primeira posição no consumo mundial.

“Esse desempenho, já esperado, está diretamente associado às medidas consecutivas e indiscriminadas de aumento de taxas e tributos, a pretexto do aumento de recursos aos cofres públicos. Seu resultado final derrubou as vendas do setor e, por consequência, reduziu as curvas de arrecadação, num efeito contrário ao pretendido pelos governantes”, afirma João Carlos Basilio, presidente executivo da associação. A desvalorização cambial, segundo a Abihpec, também contribuiu para o resultado negativo do setor.

“A categoria de produtos para banho, que tinha bom desempenho no Brasil, figurando em segundo lugar no mercado mundial, caiu para quarto lugar em 2015. E podemos avaliar que o agravamento da crise hídrica e da crise econômica contribuiu para a mudança dos hábitos de consumo e de higiene pessoal do brasileiro que, consequentemente, reduziu o tempo e a quantidade de banhos, por exemplo”, complementa Basilio.

Itens essenciais para manutenção da saúde e bem-estar do consumidor sofreram com o aumento da carga tributária em 2015 e neste início de 2016, em boa parte dos estados brasileiros. “No Paraná, por exemplo, houve um aumento na carga tributária de 108% para protetor solar. Em Minas Gerais, de 125% para creme dental e de 50% para itens básicos como sabonete e papel higiênico. Estes abruptos aumentos irão impactar negativamente o resultado do setor de HPPC este ano”, comenta o executivo.

A Abihpec acredita que um dos caminhos para que o setor possa voltar a ganhar fôlego, competitividade e mercado, é o investimento em inovação. “Em 2016 o momento é de agir e buscar a inovação de forma ampla, com foco em gestão, logística, serviços, comunicação e até mesmo na comercialização de seus produtos. Rever as estratégias e o trabalho em equipe é fundamental para manter a vitalidade e a força das empresas frente ao mercado, especialmente neste momento delicado da economia brasileira”, destaca Basilio.

Ao consumidor – A Euromonitor afirma que o mercado de beleza e cuidados pessoais registrou R$ 100,6 bilhões de faturamento em 2015, em vendas ao consumidor nos canais de varejo, incluindo os efeitos da inflação. Uma marca 57,6% maior do que a de 2010, quando o setor chegou a R$ 63,8 bilhões no País. Mas na comparação ano a ano, houve retração. Em 2014, o faturamento tinha sido de R$ 101,7 bilhões, segundo a empresa, um número que representava um crescimento nominal de 11%, comparando a 2013.

Já o setor de limpeza ficou praticamente estável. Segundo a Euromonitor, o faturamento de home care no Brasil foi de R$ 19,5 bilhões em 2015. Um crescimento de 35,6% comparando com o desempenho de 2010, quando o valor chegou a R$ 14,4 bilhões. Em 2014, de acordo com dados da Abipla (Associação Brasileira das Indústrias de Produtos de Limpeza e Afins), o mercado alcançou R$ 17,2 bilhões.

Os dados da associação (geralmente fundamentados em pesquisa Nielsen), incluindo o resultado das categorias, não haviam sido divulgados até o fechamento dessa edição da revista. Estavam previstos para junho.

Bolso mais vazio – O consumidor brasileiro apertou o bolso no ano passado. Segundo estudo global da Nielsen – que mede a percepção de perspectivas de empregos locais, finanças pessoais e intenções imediatas de gastos – o índice de confiança se manteve em uma média de 83 pontos na América Latina durante 2015, apresentando uma diferença de 14 pontos abaixo do índice global, que foi 97. O Brasil, de acordo com a empresa, chamou a atenção, pois começou o ano com 88 pontos e terminou em 76.

“O consumidor latino-americano vem mudando os seus hábitos de consumo, com menos entretenimento e compra de roupa, redução de consumo de gás e energia. Compra marcas mais em conta, economiza e paga dívidas. A preocupação com a economia cria um ambiente de gasto mais conservador por parte do consumidor, que inclusive pensa em manter algumas desses hábitos mesmo se as condições melhorarem”, disse Luis Arjona, líder da Nielsen para Chile e Brasil.

No final do ano, 93% dos entrevistados pela pesquisa da Nielsen disseram que estavam vivendo em um período de recessão, enquanto esse número era de 85% no primeiro trimestre. E essa percepção negativa continuava para os meses futuros. Perguntados no quarto trimestre sobre o que pensavam dos próximos 12 meses, apenas 13% dos brasileiros disseram que o País não estaria vivendo em uma recessão.

Resultado – Ante a esse cenário, o consumidor brasileiro buscou alternativas para manter todos os itens em seu carrinho, de acordo com a Nielsen. Entre as medidas adotadas, destacaram-se: reduzir gastos fora do lar, frequentar canais de compra com melhor custo benefício, diminuir idas ao ponto de venda, optar por embalagens econômicas e trocar de marcas.

Entretanto, o consumidor chegou ao ponto de reduzir o volume de compras, segundo Paula Valadão, analista de mercado da Nielsen. “Ou seja, cortar itens de sua lista”, disse. Segundo uma pesquisa da Nielsen, de janeiro a outubro de 2015 o consumo da cesta de produtos de limpeza, higiene e beleza, bebidas alcoólicas/não alcoólicas, perecíveis e outros itens de mercearia caiu 0,8% em volume de vendas.

Para 2016 – Algumas características de consumo identificadas pela Nielsen em 2015 podem ajudar as empresas a traçarem planos ainda para este ano. Um dos pontos é que o consumidor está mais atento a preços. “Na busca por custo mais baixo, observamos que o consumidor vai à loja, e ao encontrar um preço mais alto, logo busca referência em outros itens da gôndola (concorrência) para compreender a nova realidade, comparando os valores. É uma espécie de efeito pescoço”, diz Tatiene Vale, analista de mercado da Nielsen.

Diante desse cenário, a prática de promoções pode ser uma aliada importante. Segundo a Nielsen, para os setores de higiene e beleza e limpeza caseira, as embalagens promocionais podem ser um caminho promissor. Exemplos são: ‘leve pague’, produto adicional, volume grátis etc.

Também deve ser considerado o ponto de venda. De acordo com a Nielsen, os consumidores ‘adaptam suas missões de compra’, buscando mais abastecimento no atacarejo (cash&carry). A empresa destaca esse canal, revelando que ele cresceu 47% em 2015, por meio da abertura de novas lojas no País. “Essa pulverização foi importante para gerar maior acesso ao canal e também contribuiu para a formação de um novo perfil: hoje, 50% a 70% dos compradores já são pessoas físicas”, afirma Tatiene.

Além de buscar novos locais ou trocar o lugar onde faz suas compras, o consumidor também está mais disposto a trocar de marcas – o que exige ainda mais esforço das fabricantes de produtos para manterem os seus itens competitivos. Pelo menos isso foi identificado no ano passado. A Nielsen diz que 41% das marcas líderes retraíram volume de vendas em 2015, sendo que seis das top 10 marcas líderes perderam lealdade. Dessa forma, de acordo com a empresa, acontece o que é chamado deTrade Down, ou troca por marcas baratas.

“Com um consumidor menos fiel, é imprescindível trabalhar três pilares para chamar a sua atenção e conquistá-lo: execução correta no ponto de venda, tanto em preço quanto em disponibilidade de produtos; foco em inovações que apresentem uma clara relação de custo/benefício, especialmente voltado à saúde e ao bem-estar; e manter aquecidos os investimentos de mídia, condicionando a lembrança constante e estabelecendo vínculos com o consumidor”, diz Lucas Bellacosa, analista de mercado da Nielsen.

Fonte/veículo: Revista H&C

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