Nova regra de ICMS importação cria desafios comerciais

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10abril2013

GUERRA DOS PORTOS


Por Luis Eduardo Longo Barbosa

Com a publicação da Resolução 13/2012 do Senado, a alíquota do ICMS em operações interestaduais realizadas com bens ou produtos importados, antes fixada em 7% ou 12%, foi reduzida para 4%. A norma em questão também estendeu o novo tratamento fiscal a bens industrializados cujo conteúdo de importação do produto final seja superior a 40%.

Para regulamentar a forma como deveria ser informado referido conteúdo de importação, o Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz) editou o Ajuste SINIEF 19/2012, estabelecendo nova obrigação acessória aos contribuintes — o preenchimento da Ficha de Conteúdo de Importação (FCI), com discriminação de todos os custos e o conteúdo da importação de cada bem ou mercadoria importado.

A nova regulamentação também estabeleceu a obrigação, para as empresas, de informarem, nas notas fiscais de saída de seus produtos o conteúdo de importação e o efetivo custo de importação relacionado a cada operação.

Essas novas exigências instituídas pelo fisco, principalmente quanto à obrigatoriedade de abertura e repasse de informações relativas ao custo de aquisição dos bens importados, praticamente em todos os seguimentos industriais, instalou enorme clima de insegurança entre os contribuintes, em vista do justo receio de que a nova obrigação fiscal implique, em termos práticos, a abertura de segredos estratégicos das empresas.

De forma objetiva, com um simples raciocínio lógico, é possível antever que a obrigação de divulgação dos custos de importação permitirá, num primeiro momento, aos compradores e, subsequentemente, à concorrência, tomar conhecimento de importante informação acerca dos custos de seus fornecedores. Tal informação, se bem analisada, poderá permitir que se chegue não só à composição dos custos e margens das empresas, mas, até mesmo, aos segredos industriais relativos à composição dos produtos.

Apesar de ainda não haver farta jurisprudência sobre o assunto, por se tratar de discussão muito recente, vale ressaltar que o Judiciário tem apresentado precedentes favoráveis ao contribuinte, através da concessão de medidas liminares desobrigando a divulgação de informações relativas ao custo de importação em nota fiscal, com base no principal fundamento de que referida divulgação implicaria a quebra do direito de sigilo comercial das companhias e violação do princípio constitucional da livre concorrência.

Em termos práticos, em tais precedentes, o Judiciário vem considerando que a divulgação de tais dados (sigilosos) implicaria sério risco de má utilização pelo mercado, abrangendo tanto os próprios clientes quanto a concorrência.

Além dos fundamentos acima, relacionados à violação de princípios legais e constitucionais pela nova norma, também se faz importante destacar os perigosos reflexos práticos que tal norma pode significar para as empresas.

Nesse contexto, a principal polêmica refere-se à ausência de clara previsão quanto à metodologia a ser adotada para se proceder ao cálculo do conteúdo de importação, sobretudo no que diz respeito à forma de avaliação e controle dos estoques, desde as matérias primas e insumos até os produtos acabados das empresas.

No caso de contribuintes que adquiram insumos produtivos de mesma espécie, tanto no mercado interno quanto no externo, caso não haja um rigoroso processo de segregação e armazenagem de referidos insumos, de acordo com a origem dos mesmos (nacional ou estrangeira), a determinação do conteúdo de importação com base no controle individualizado dos produtos finais restará prejudicada, uma vez que se encontraria inviabilizada a rastreabilidade da origem dos insumos que compõem o produto final.

Ocorre, contudo, que grande parte dos contribuintes, atualmente, não possui condições técnicas e tecnológicas que permitam a implementação segura de tais controles, tampouco condições práticas para viabilizar uma metodologia de segregação de estoques baseada na origem dos bens, o que, como regra, implicaria a necessidade de duplicação das estruturas (e custos) de armazenagem e gestão logística de seus estoques.

A título ilustrativo, imaginemos uma indústria de produtos químicos, de tintas e vernizes, por exemplo, que em sua produção tenha como matérias primas básica resinas e corantes líquidos, alternativamente, adquiridos de fornecedores nacionais ou estrangeiros, conforme as melhores condições comerciais oferecidas. De plano, surge enorme interrogação: como se demonstrar o conteúdo de importação de cada litro de tinta produzido, uma vez que os insumos produtivos (nacionais e estrangeiros), invariavelmente, acabam por ser integralmente misturados nos tanques e maquinários da linha de produção?

Em suma, pela alta complexidade (e onerosidade) em se adaptar os métodos e sistemas de controle de estoques e logística produtiva, são grandes as chances das empresas, na prática, virem a se deparar com a impossibilidade de individualizar a exata composição e origem de cada insumo no produto acabado.

Certamente, não pode a inovação estabelecida pela legislação do ICMS sugerir que referida empresa, “simplesmente”, duplique sua estrutura física e linha de produção, ou arque com custos impeditivos na criação e instalação de mecanismos de rastreabilidade da origem (“nacional” ou “importada”) de seus estoques e produtos (item a item), com a finalidade exclusiva de atender à nova obrigação fiscal.

Portanto, verifica-se que a nova normatização não trouxe apenas novos deveres fiscais aos contribuintes, mas, sobretudo, sérios desafios em âmbito comercial e operacional, os quais se não forem muito bem administrados podem resultar em sérios e negativos reflexos às empresas.

Assim, diante do alto grau de insegurança do atual cenário, é importante que os contribuintes se amparem em todos os instrumentos legais ao seu alcance, tanto em esfera administrativa quanto judicial, sobretudo nessa fase inicial do novo procedimento fiscal, aonde a própria metodologia de implementação encontra-se carente de regramento.

Ressalte-se, por fim, a importância da rápida adoção, pelas empresas, de medidas em defesa de seus interesses, uma vez que, independentemente dos aparentes vícios das novas obrigações impostas pelo fisco estadual, caso o contribuinte se omita ou proceda às mesmas com incorreções, certamente será alvo de questionamentos e autuações por parte das autoridades competentes.

Luis Eduardo Longo Barbosa é tributarista do Trigueiro Fontes Advogados

Revista Consultor Jurídico, 10 de abril de 2013


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