Novos ingredientes fiscais corporativos

 

Por Roberto Goldstajn

O ambiente de negócios no Brasil se encontra extremamente vulnerável em virtude dos escândalos que apontam o desvio de bilhões de reais dos cofres públicos. Somada a essa realidade, o governo federal tem envidado enormes esforços para cumprir meta fiscal por meio de aumento da carga tributária. Isto é, revisão de desonerações setoriais, cortes nos investimentos necessários para melhoria em setores essenciais, notadamente infraestrutura, a par da implementação de novas ferramentas fiscalizatórias eletrônicas, tais como, ECF, ECD, eSocial, Bloco K, e­Financeiro, dentre outras.

Esse esforço tem exigido grandes investimentos dos contribuintes, da Secretaria da Receita Federal do Brasil e das secretarias de Fazenda estaduais e municipais para otimizar tais mecanismos de fiscalização no intuito de incrementar as receitas tributárias e fazer frente à exigência de equilíbrio nas contas públicas. As empresas devem pensar em políticas tributárias sem perder de vista o novo cenário global em termos de fiscalização Na esteira dessas novidades, o governo federal também tem monitorado transações realizadas entre empresas como forma de evitar operações sem propósito negocial e focadas apenas em “redução, supressão ou diferimento de tributo”. É o conhecido planejamento tributário, execrado por muitos.

Cumpre destacar ­ mais uma vez ­ que o planejamento tributário lícito é aquele que inibe e/ou posterga a ocorrência de fatos geradores por meio de práticas eminentemente empresariais, o que significa que não se decretou a morte dessa modalidade de administrar o caixa. Desse modo, as empresas devem focar na substância das operações e na respectiva fundamentação econômica para validação de seus planejamentos tributários. Nesse enleio, vale mencionar trecho do voto proferido pela ministra Ellen Gracie, do Supremo Tribunal Federal (STF), que analisou a substância de uma operação de leasing para aquisição de maquinários oriundos do exterior com o fito de elidir a incidência tributária do ICMS, transcrito a seguir: “Entendimento contrário (ou seja, o de que a operação externa de leasing não autoriza a cobrança de ICMS) levaria ao estímulo de que as aquisições de bens de capital passassem a ser feitas por essa via de ajuste, para assim evitar a incidência tributária.” (RE nº 206.069, DJU 01/09/05) Como se nota do julgado, o próprio Poder Judiciário tem buscado compreender a essência das operações antes de validar qualquer tipo de planejamento tributário.

A primeira grande novidade nesse campo foi a exigência implementada pelo parágrafo 3º, do artigo 20, da Lei nº 12.973/14 que determinou a necessidade de Protocolo de Laudo de Avaliação de participação societária para desdobrar o custo de aquisição em mais ou menos­valia e/ou ágio por rentabilidade futura (goodwill). Tal exigência visa fiscalizar a licitude quanto à utilização de fatores impactantes na apuração de custos tributários. Mais recentemente, o governo federal editou a Medida Provisória nº 685/15 instituindo uma nova obrigação fiscal impactante no mundo dos negócios, nesse caso, a obrigatoriedade de declarar, inclusive, aqueles não concretizados, à Secretaria da Receita Federal “atos ou negócios jurídicos que acarretem supressão, redução ou diferimento de tributo” em casos atípicos e/ou específicos elencados pelo próprio Fisco ainda pendente de regulamentação.

Com efeito, as empresas que descumprirem essas normas estarão sujeitas as penalidades previstas na legislação tributária, inclusive, com reflexo na esfera penal. Para atender todas as exigências fiscais, as empresas são obrigadas a manter um verdadeiro “exército” de pessoas na área fiscal, para garantir a qualidade do fluxo de informações contábeis transmitidas aos investidores, acionistas/sócios, executivos e órgãos públicos, bem como, profissionais aptos para manter relacionamento ético e transparente com o Fisco.

E, finalmente, vale destacar outra nova novidade fiscalizatória, que vigorará a partir de dezembro de 2015 para as Instituições Financeiras, é a criação do e­Financeiro que nada mais é do que uma nova ferramenta eletrônica capaz de monitorar todas as operações financeiras realizadas no Brasil. Referida novidade atenderá de uma só vez duas importantes demandas internacionais: Acordo de Cooperação entre Brasil e Estados Unidos para atender exigências da FATCA (Foreign Account Tax Compliance Act) e o Plano de Ação do Beps veiculado pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) para o combate à erosão fiscal e ao desvio de resultados para jurisdições de baixa tributação.

Porém, a finalidade arrecadatória dessas exigências, em muitos casos, inviabiliza novos investimentos, nacionais e/ou estrangeiros, indispensáveis para a geração de empregos e aumento da base de consumo. Assim, as empresas devem pensar em políticas tributárias que privilegiem o desenvolvimento de suas atividades sem perder de vista o novo cenário global em termos de fiscalização.

Roberto Goldstajn é sócio do Fernandes, Figueiredo, Françoso, Petros Advogados Este artigo reflete as opiniões do autor, e não do jornal Valor Econômico. O jornal não se responsabiliza e nem pode ser responsabilizado pelas informações acima ou por prejuízos de qualquer natureza em decorrência do uso dessas informações

Fonte: Valor

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